"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Não me encaixo - A raiva e a inveja



Essas festas em família. Devo admitir que quase sempre as odeio. Eu tento, juro que tento, sentir que eu faço parte de tudo isso, que eu sou um de vocês e toda essa baboseira. Mas eu não sou. Simplesmente não sou. Todos os segundos que eu passar com esse família, vai ser mentindo, me escondendo nos cantos das salas barulhentas, invisível. É o que eu sempre faço desde que me entendo por gente. E ninguém nem liga. Ninguém vem em minha direção e tenta conhecer a Sabrina de verdade, ninguém. Talvez esse seja um papel meu, andar na direção de alguém e me mostrar. Assim do nada, sei lá. Foda-se, estou desanimada para essas coisas. Que eles pensem o que quiserem de mim. Que eu sou louca, problemática, etc, etc etc. Não me importo. Só queria desaparecer.

Posso ouvir minha mãe tocando piano para minha avó na sala, junto com meu irmão, tocando fagote. Ela está fazendo um papel que é meu, tocar piano junto com meu irmão idiota, eu deveria fazer isso. Mas como sempre, eu não posso. Eu não consigo. Minhas mãos tremem de ansiedade e medo só de pensar em tocar com alguém ouvindo, principalmente se esse alguém for a minha avó. E meu irmão toca com a facilidade com a qual minha mãe nasceu para a música. Todo mundo se orgulha do meu irmão... Ele é a pessoa mais idiota do mundo e todo mundo o elogia como se ele fosse perfeito. Não preciso nem dizer o quanto isso me deixa maluca. Ninguém liga para o que eu faço. Na época do vestibular eu passei para a segunda fase da fuvest mesmo estando absurdamente mal emocionalmente e ninguém se surpreendeu, meu irmão tirou míseros 35 pontos, como se fosse uma mula, e ele nem levou bronca. Eu completei uma iniciação científica, consegui bolsa por um ano na minha faculdade e recebi trocentos elogios de diversos mestres e professores... E minha família nem sabe praticamente.

Tudo sempre gira em volta da maldita igreja. Eu não vou na igreja, meu irmão vai. Está ai a grande diferença. A partir do momento que eu deixo de fazer parte dessa comunidade, eu estou automaticamente excluída da família, sou uma vergonha, uma decepção e sabe-se lá mais o que. Quero que se exploda essa igreja. Meu irmão é um hipócrita como 90% das pessoas que frequentam esse lugar (os outros 10% são burros de mais para entender o que significa hipocrisia então eles não contam). E eu não acho que isso seja motivo para orgulho. Ele pode tocar todos os instrumentos do mundo, ele continua sento um molequinho mimado, egoísta, escroto, hipócrita, cruel e oportunista. Não importa o quão cego vocês sejam, a verdade está ai e uma hora ela vai se mostrar. Uma hora meu irmão vai se foder como nunca na vida. E, bem, eu vou ter avisado.

domingo, 30 de dezembro de 2012

O border e a autoimagem



Estou lendo um livro sobre meu transtorno, pensei que seria bom, me conhecer melhor e aprender a lidar melhor com minhas dificuldades. Mas parece que não. A cada página que eu leio, mais desesperada eu fico. Eu pensei que já tivesse aprendido a conviver pacificamente com meu diagnóstico. Mas também parece que não. Eu simplesmente leio e leio e penso que não posso ser assim. Consigo enxergar como e onde eu me encaixo no diagnóstico mas quando leio as histórias de outros borders, eu simplesmente tenho vontade de me atirar de uma ponte. Eu não quero ser assim. Isso tudo é simplesmente horrível de mais, escuro de mais, sem esperança, sem nada remotamente positivo. E eu não quero ser assim. E se eu não puder evitar, eu não quero que ninguém saiba que eu sou assim. Eu não quero meus defeitos exagerados expostos por aí, por essas malditas cicatrizes em meus braços, pelo meu comportamento ou o que quer que seja. Sinto vontade de sumir, de desaparecer. Quero bater minha cabeça na parede até rachá-la no meio por ter contado para as pessoas a minha volta quem eu sou assim tão facilmente. Imagina se alguém lê esse livro ou um site qualquer que fale sobre o transtorno, não é preciso muito cérebro para entender que é melhor ficar o mais longe possível desse tipo de pessoa, de mim.

Eu odeio esse tipo de pessoa. E nem chega a ser irônico porque eu me odeio abertamente há um bom tempo. Tenho medo de olhar no espelho porque geralmente só isso é o suficiente para me fazer chorar por horas e começar a querer me machucar o bastante até que nada mais importe. Odeio espelhos. E no entanto não consigo parar de olhar meus reflexos, sentindo as ondas de raiva me tomando, me perguntando o que, droga, há de tão errado comigo, quem sou eu, porque não me sinto, onde estou... E há meu monstro. Um professor meu uma vez me disse que todos nós possuímos monstros dentro de nós. Acho que ele não entendeu o que eu quis dizer. Quando eu digo que há um monstro dentro de mim, não é uma metáfora, algo que tenha um significado profundo ou sei lá o que. Realmente existe um monstro dentro de mim, entendem? Posso sentir sua respiração, seus movimentos, quando ele se liberta das amarras que eu crio para contê-lo, posso sentí-lo tomando conta do meu corpo e me obrigando a fazer coisas que eu não quero, a sentir coisas que eu não entendo. Minha psicóloga não gosta que eu fale de meu monstro, nem meu médico eu acho. Acho que eles me acham meio psicótica ou fantasiosa. Mas o que eu posso fazer? Eu posso até não falar, mas sentir eu sinto. Meu monstro faz parte de mim. E talvez seja por isso que eu me odeie tanto.

Não gosto das coisas que ele pensa, sente e faz. Minha psicóloga diz que tudo isso que ele pensa, sente, faz, sou eu pensando, sentindo e fazendo. Pensando racionalmente eu entendo o que ela quer dizer, mas não é isso que eu sinto. Alias há sempre uma guerra dentro de mim entre a razão e a emoção. E a emoção geralmente ganha. De qualquer jeito... Eu não consigo aceitar quem eu sou. Assim como quando eu leio as histórias dos outros borders e eu sinto repulsa pelos mesmos. Quando eu leio histórias de pessoas com qualquer outro problema eu sinto compaixão... Mas com os borders não. Por que eu não tenho compaixão para comigo mesma, logo, não consigo ter para com aqueles que lembram a mim de mim mesma. Não sei... Mas talvez eu devesse parar de julgá-los tão duramente. Mas é difícil... Se você lesse acho que você entenderia o que eu quero dizer. Não somos exatamente flor que se cheire.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Tontura e sensações



Me sinto tonta, de novo. Do nada, sem explicação, como meus sentimentos e sensações sempre parecem aos meus olhos. Não sei ao certo se as coisas não possuem razão ou se sou eu que não consigo identificá-la. De qualquer jeito me sinto estranha. Fecho os olhos, ralho comigo mesma e os abro assustada, olho para minhas mãos involuntariamente, ralho comido mesma de novo e as mantenho fora do meu campo visual, olho para o copo de suco na minha frente. Vidro. Posso sentir minha alma, ou seja lá como se chama essa coisa, minha personalidade, tudo o que eu sou ou reconheço como sendo meu, saindo de meu corpo. Vidro. Minha cabeça gira. Me sinto Alice quando ela cai na toca do coelho, rumo ao pais das maravilhas. Caindo, caindo, caindo. No meu caso caindo para cima, voando sobre minha cabeça, me abandonando. É de vidro o copo. Está aí algo importante. Permito que minhas mãos voltem para meu campo de visão para que eu possa segurar o copo, não ligo muito para o fato dessas mãos não parecerem minhas e que pouco a pouco o que elas fazem parece se tornar cada vez mais desconectado. É bonito esse copo de vidro. Me lembro do caco de vidro que eu mantinha escondida na minha gaveta, só para o caso de uma emergência. A gente nunca sabe quando vai precisar de um não é mesmo? Costumava me manter segura, esse pedaço de vidro. Mas um dia em que eu estava mais forte minha psicóloga conseguiu me convencer a jogá-lo fora.

Às vezes ainda me arrependo. Não tanto pela auto-mutilação, mas só pela sensação de segurança que ter algo cortante me proporcionava. Isso soa estranho? De qualquer jeito fiquei olhando o copo, ainda me sentindo estranha, com minha cabeça rodando, e com a imagem do maldito copo se movendo de forma familiar, como se eu estivesse embaixo d'água ou coisa assim. Eu conheço tudo isso muito bem. Eu poderia quebrar o copo, poderia me agachar e fazer o que eu tanto tenho vontade, o que eu tanto luto todos os dias para não voltar a fazer, poderia. Seria fácil. Não tinha ninguém ali. Virei o resto de suco que tinha no copo, mesmo não querendo tomá-lo, e me sentindo mais esquisita do que nunca o coloquei de volta na mesa e sai correndo para meu quarto, para sentar aqui e escrever. Por que, apesar de tudo, mesmo eu tendo diminuído e muito a frequência de meus textos, ainda acredito que eles são a janela para que eu não enlouqueça. Me sinto um pouco mais viva enquanto meus dedos digitam qualquer coisa aqui, me sinto um pouco mais presente. É verdade que quase nada se iguala a sensação de ter uma lâmina na minha pele e não me importo se isso soa masoquista, só estou sento sincera. Não se pode fazer trocas, eu já tentei trocar muitas coisas pela automutilação mas essas trocas nunca duraram muito tempo. Acredito que é preciso aceitar primeiro que isso é sim uma parte muito importante de você, mesmo que seja muito ruim, e que nada vai substituir isso. Por que você pode passar a vida procurando sentir a mesma coisa fazendo outras coisas, mas isso sempre irá te levar para caminhos ruins, como drogas, álcool e sexo totalmente não seguro. É um vício, não se troca um vício pelo outro, isso não é construtivo.

Um vício precisa ser combatido ele por ele mesmo. Um viciado sempre vai sentir vontade de voltar a fazer ou usar seu vício, isso é fato, não adianta negar. Eu ainda tenho vontade de me cortar, como hoje, mas é só uma vontade e eu a combati e ganhei, deixando o copo exatamente onde ele estava e ignorando minhas sensações estranhas. Enquanto eu puder fazer isso, está tudo bem. Faz parte de mim, mas eu estou sob controle, mesmo que às vezes não pareça muito. Mas eu realmente acho que agora, ao menos agora, eu estou sob controle e é isso que mais importa.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Desajeitada socialmente falando



Te convidam para sair e você tem vergonha que alguém perceba alguma coisa. Faz calor e você tem vergonha de tirar a blusa. Te oferecem bebida e você tem vergonha de dizer que não pode. Suas mãos tremem e parece que sempre de forma pior quando alguém está olhando para elas. Você só queria parar, porque tudo isso faz você parecer nervosa e esquisita, e você nem está tão nervosa assim e você não quer parecer tão esquisita assim. Mas nada obedece e isso é tão irritante. Às vezes eu só queria sumir, mas não dá. Às vezes eu queria não ter vergonha de mim mesma, e me orgulhar de mim mesma, as pessoas às vezes me falam para eu me orgulhar.... Mas eu não consigo. Acho que é um pouco difícil de mais, não sei. Eu não quero ser diferente, acho que ai está a angustia toda, eu quero fazer parte, quero me sentir parte de algo. Então eu odeio a mim mesma quando sento em uma roda e simplesmente não consigo falar absolutamente nada, todo mundo fala, não deveria ser tão difícil. É, é muito difícil. Meu me odeio por não poder beber e me odeio quando bebo porque não posso. Odeio minhas cicatrizes em meus braços e odeio quando minhas mãos tremem por causa dos remédios. Odeio ser tímida e desajeitada. Odeio como me sinto feia e inferior às pessoas que estão comigo. Odeio como eu invejo a vida de qualquer um. E odeio como tudo isso contribui para eu me tornar muito distante e aérea.

Tudo isso é muito ridículo, e eu não consigo fazer diferente. Eu queria só não ligar para nada e simplesmente me divertir. Ser eu mesma! É o que todo mundo fala, como se fosse algo fácil ou óbvio. Não é. Primeiro porque eu não faço ideia de quem eu sou, não mesmo, é difícil separar meu transtorno da minha personalidade. Até porque é um transtorno da personalidade, o que eu tenho, ou seja, minha personalidade é "doente", por assim dizer. Eu nunca sei direito se existe a "personalidade normal" da Sabrina e a "personalidade Borderline" ou se só existe a minha personalidade que é Borderline. Entende? De qualquer jeito eu preciso me observar constantemente, para conseguir identificar quando a parte doente de mim mesma começa a agir e para pará-la antes que ela faça mais um estrago muito grande. Então, ao me "vigiar" eu de certa forma estou me proibindo de ser eu mesma. Porque, ser eu mesma, significa dar liberdade para todas as faces da minha personalidade, inclusive a considerada "doente". Essa vigilância toda me deixa muito nervosa e incomodada. Tenho um medo absurdo de escorregar, como vira e mexe eu faço, e decepcionar as pessoas a minha volta.

E eu acho que esse é um dos grande motivos que eu sou tão desajeitada socialmente falando. Eu não posso ser eu mesma, então eu quase nunca estou confortável, o que faz com que eu entre em um ciclo vicioso de comportamentos que eu odeio. Às vezes eu penso se não seria melhor eu jogar todo meu tratamento pro teto e viver livre, leve e solta. Mas ai eu olho para meus braços e me lembro que a pseudo-liberdade pode custar muito caro.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Somos infinitos



Eu sei que nem sempre é verdade, mas na maioria dos casos a gente se arrepende mais do que a gente nunca fez do que o que a gente já fez. Quero dizer, é mais triste olhar para trás e não ver coisa alguma do que olhar para trás e ver um monte de merda. Quando eu olho para trás, vejo que todos os erros que na época tanto me fizeram sofrer, hoje quase não possuem importância nenhuma e estão ali, em seus cantinhos, como mais uma experiência e algo que muito provavelmente eu não vou fazer de novo, mas que foi bom eu ter feito. Mas foram poucos erros. Eu sou naturalmente cuidadosa, mas quando meu monstro vem a tona, me torno uma impulsiva autodestrutiva. Tanto a Sabrina quanto o Monstro já cometeram erros, e por mais que na época eu quisesse me matar por cada um deles, hoje eu não ligo. Para ser bem sincera queria ter perdido o controle da situação mais vezes, mas isso é um segredo, cá entre nós. Queria ter bebido mais enquanto podia, queria ter experimentado mais drogas, queria ter dançado mais vezes, queria ter ido a mais shows (esse ano eu fui em meu primeiro show, com 20 anos nas costas). Eu queria ter conversas regadas a vinho, discussões, sexo! Queria ter sido mais feliz.

O grande problema é que na maior parte de toda a minha vida eu estava ocupada de mais me sentindo desconfortável para me divertir e ser feliz. Eu pintava minhas mentiras cuidadosamente, diariamente, para enganar a mim mesma e caso alguém ou alguma coisa tentasse me tirar desse meu transe, eu rapidamente me tornava agressiva e arisca, me fechava mais ainda, serrando meus pulsos com minha raiva sempre um pouco desproporcional de mais. Eu não tinha muito tempo para cometer os "erros" que todo mundo cometia. Eu não tive muito tempo para ser criança ou adolescente e nas pequenas escorregadas que eu dava eu me arrependia tanto e tão amargamente que não seria surpresa se hoje eu ainda estivesse no mesmo transe que eu estava quando era pequena. Mas ninguém é perfeito. E por mais que eu quisesse ser, graças a deus, eu nunca cheguei nem um pouquinho perto disso. E aos poucos toda a imagem que eu pintava sobre a minha história, sobre a minha vida, foi se rachando e quebrando e por fim, a realidade veio a tona.

Hoje a principal coisa da qual eu me arrependo é a de ter gasto tanto tempo mentindo para mim mesma, desperdiçando os anos que deveriam ser leves, agradáveis e felizes. Tenho poucas lembranças felizes. Eu correria o risco de me perder para ter mais desses lembranças. Afinal como a vida pode valer a pena sem elas? Que histórias eu vou contar para meus filhos? Do que eu e meus amigos vamos rir quando ficarmos mais velhos? Eu invejo muito pessoas que já fizeram um monte de besteiras na vida. Minha vida foi sempre tão regrada e eu quase nunca tive a coragem para quebrar essas regras. Mas estou tentando. Estou tentando participar. Como Charlie, daquele livro do Stephen Chbosky.

sábado, 22 de dezembro de 2012

De novo e de novo e de novo... - Sobre a compulsão à repetição



Outro conceito interessante de Freud, que eu li no meu mais novo livrinho muito interessante, é a compulsão à repetição, ou seja, a tendência da mente de reviver situações desagradáveis ou traumáticas. Me perdoem se eu entendi errado, mas parece que a mente se utiliza desse mecanismo para gerar angustia e, assim, se proteger. A angustia nos prepara para o perigo, dessa forma, ao gerar angustia a mente estaria nos preparando para caso a situação traumática aconteça novamente. O que causa a neurose traumática é o susto, dessa forma a memória dolorosa é revivida frequentemente, gerando angustia, até que uma defesa eficiente tenha sido construída em nossa mente após o evento. É por isso, e finalmente tudo isso faz sentido, que quando algo ruim acontece, aquilo demora tanto para sair de nossas mentes, ou até mesmo nunca chega a sair, quer essa vivência esteja sendo revivida exatamente como aconteceu, quer ela esteja aparecendo de forma disfarçada ou mascarada.

É um exercício cansativo. É comum, por exemplo, que a pessoa traumatizada tenha pesadelos diariamente sobre o que quer que tenha acontecido. Inicialmente esse mecanismo repetitivo parece inútil, como uma enorme roda gigante de auto-tortura. Noite após noite acordando assustado, suando frio, medos irracionais, nevosismo e inquietação excessivos ao se ouvir um determinado som, ou sentir um determinado cheiro ou ver algo, ou pensar que se viu algo. A vida se torna pesada, muito pesada. Você passa a viver sempre na defensiva, como se a qualquer momento aquilo pudesse acontecer novamente, e realmente pode. Na verdade já está acontecendo, todo o santo dia, dentro da sua mente. E o fato de não ser "real" não quer dizer que o sofrimento seja menor. Mas por mais que tudo isso pareça inútil, existe uma razão para você não conseguir esquecer.

Não é para você esquecer. Sua mente precisa aprender a se preparar e a lidar com o que lhe aconteceu, dessa forma ela estará enfim protegida. Imagino que isso signifique "superação"? Talvez. Se pensarmos que superação signifique passar de uma situação ruim para uma boa, evoluir, se recuperar... Faz sentido. Quando sua mente aprende a lidar com o fato traumático, sua lembrança se torna só isso, mais um lembrança. Ela nunca vai ser uma boa lembrança, óbvio, mas pouco a pouco vai deixar de se tornar uma tortura, um peso, uma ferida aberta. E as noites em que você vai acordar suando frio, em meio a um grito mudo, vão se tornar cada vez mais raras... E um dia, quem sabe, você vai poder inclusive falar sobre isso com outras pessoas sem acabar em um mar de lágrimas e desespero. Isso é crescer. Evoluir, se superar.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Freud e as lembranças afogadas



As piores lembranças são aquelas que não conseguimos ter acesso. Isso me veio em mente enquanto lia o livro sobre Freud que eu ganhei hoje de um professor muito querido meu. Fico repetindo a frase para mim mesma, como se uma luz tivesse se acendido em minha mente e, por mais que eu tenha notado algo de diferente, ainda não sei dizer o que, como nem onde. Tenho medo da minha mente e não sei até onde isso é considerado normal. Nunca perguntei para alguém, como quem não quer nada, você tem medo da sua mente? Isso seria entranho. De qualquer jeito, tenho medo. Imagino meu cérebro como um lugar em caus completo, cheio de rachaduras, sujeiras, labirintos e becos. E há as lembranças, espalhadas para todo o lado, algumas mais desgastadas outras ainda novas. Entre essas lembranças há aquelas que eu não gosto de olhar ou entrar em contato de jeito nenhum, mas o que mais me assusta não é a existência dessas lembranças e sim há existência das lembranças que, justamente, eu não consigo acessar. Como se existisse um inferno secreto, mais fundo do que meu inferno atual, no qual coisas piores e mais assustadoras existem.

Você nunca teve essa sensação? Ao tentar se lembrar de algo, de que algum pedaço do que quer que você esteja tentando se lembrar é simplesmente impossível de ser recuperado? Como se alguém tivesse queimado um período de lembranças da sua mente ou como se existisse uma barreira entre você e elas, uma barreira intransponível. Eu tenho muito essa sensação. Me pergunto o que poderia ser, guardado tão bem guardado desse jeito. É difícil até chegar perto disso, é como se queimasse, destruindo qualquer coisa a sua volta, eu simplesmente não consigo. Lembro da época em que estive internada e o psicólogo da clínica tentava arrancar algo de mim. Doía muito, eu chorava muito... Mas não cheguei nem um pouco perto de descobrir o que eu guardo tão profundamente dentro de mim. E ele sabia, de alguma forma que eu não consigo entender, que eu guardava muitas coisas e que eu precisava vomitá-las antes que elas me destruíssem. De qualquer jeito, eu não fiz muitos avanços na clínica a esse respeito.

Mas talvez não seja coisa alguma. Talvez as pessoas precisem fingir que guardam algo, bem lá no fundo, por que admitir sua superficialidade seja algo chato e fora de moda de mais. E se assim for eu posso respirar aliviada, já que essa é uma tremenda prova de que eu sou igual e normal. Mas talvez não, talvez Freud tenha razão e bem lá no fundo, passando todas as barreiras, há algo mal resolvido que pode explicar e resolver todos os meus problemas atuais. Se realmente fosse possível atenuar meus sintomas só recuperando esse espaço perdido em minha mente, eu colocaria a mão no fogo.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Uma luta que já nasceu morta



Alguém precisa tirar esse espinho de mim. Meu coração sangra e é difícil até chorar. Estou um pouco cansada, não sei ao certo de que. Há todos esses sentimentos explodindo dentro de mim e eu não sei como expressá-los, não sei como deveria deixá-los sair. Antes havia saídas, autodestrutivas, é verdade, mas ainda assim, saídas, válvulas de escape, agora não resta nada. Minha cabeça e meu peito doem constantemente, e nem escrever direito estou conseguindo. São os remédios? Estou sempre culpando os remédios, olho sempre com desconfiança para eles... Quando minhas mãos tremem e escrever se torna um trabalho ridiculamente árduo, quando meu raciocínio se torna ridiculamente lerdo, quando meus olhos enxergam o mundo em câmera lenta, quando o que não se mexe passa a se mexer, ou quando minha visão se torna turva, ou quando meus pensamentos se tornam repetitivos, quando fico paranoica e tenho medo de abrir os olhos, ou abrir uma porta, ou dar um passo a frente, etc, etc e etc.

Sempre acho que eles estão agindo de mais, ou agindo de menos. Nunca na medida certa. Na medida que eu acredito que poderia me tornar uma pessoa normal. Ai você pode me dizer, como já ouvi milhões de vezes, que ninguém é normal e toda essa historinha que a gente conta para as crianças de que cada pessoa no planeta é única e especial e não sei mais o que. Não. Não estou dizendo normal nesse sentido, estou dizendo normal no sentido: "Não tenho nenhuma doença que de alguma forma dificulta de forma significativa a sua vida". É... Eu gostaria muito de não ter esse monstro dentro de mim, e toda essa dor, e raiva, e confusão. Tenho sérios problemas em superar coisas ou dificuldades, em dar a volta por cima e em esquecer e perdoar. Me considero uma pessoa atrasada e difícil. Não gostaria de ser assim... Gostaria de ser leve e livre como algumas pessoas o são (e como eu as invejo). Aquelas pessoa comunicativas e simpáticas, inteligentes e engraçadas e já chega por ai porque perfeição de mais também irrita.

Mas as coisas nunca são fáceis, pelo menos as que realmente importam. Não consigo ser essa pessoa legal, comunicativa e cheia de amigos. Talvez seja porque eu não sou assim. Mas na verdade eu não sei como realmente sou. Já que minhas emoções extremas podem me tornar pessoas opostas e incoerentes entre si... Mas ai vem os remédios, que me prendem no limbo que é o meio de tudo isso, nem uma coisa nem outra, o nada, o vazio. Eu não consigo me enxergar como uma pessoa normal, como eu deveria me sentir quando todos esses remédios e terapias conseguem me controlar... Eu me sinto como uma pessoa anulada. Me sinto como um animal selvagem preso em uma minúscula jaula de um zoológico qualquer. Eu, o que eu sou, sou obrigada a admitir, na mais pura essência, é aquela tão conhecida bagunça, aquela dor e raiva desmedidas, o sangue escorrendo pelos meus braços, um coração pulsante e descompassado, pupilas dilatas, punhos cerrados e, enfim, choro, fraqueza, dependência, infantilidade. A minha personalidade, tudo o que eu sou, está em um livro de doenças, mas sabe... Não importa, importa? Essa sou eu. Esses são os meus defeitos. E essa luta, se você olhar bem, já nasceu morta.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Machismo, racismo e homofobia nossa de cada dia



Teve aquele que apanhou. Na Paulista de novo? E nos Estados Unidos o que foi torturado pelos pais e pela igreja. O bullying continua, e os suicídios... Tem lugar no mundo que quer voltar a tratar o assunto como crime de pena de morte... E em casa eu ainda sou obrigada a olhar para a cara de uma Veja todo santo dia. Ah... A antiga classe média, branca e conservadora brasileira. Todos pensam tão iguais, tão superficialmente iguais, tão pateticamente iguais. Tenho vontade de sacudir-lhes a cabeça, tirar as teias de aranhas desses pensamentos há tanto tempo enraizados e intocados. E mesmo a juventude! Tão velha das ideias que chega a ser assustador. Me pergunto se há esperança, me pergunto se é possível abrir os olhos de quem nunca soube o que fazer com eles. Talvez não. A raiva bate em meu peito, vontade de gritar, vontade de sair correndo, como não enxergam? Como não crescem, não se mexem, não raciocinam, não coisa alguma. Já estão mortos, há muito tempo, talvez antes mesmo de nascerem. E eu gastando minha energia com o que já foi perdido... Deveria só ignorar e seguir em frente, me importar com quem ainda vale a pena.

Mas sou teimosa de nascença, assim como eles, só que minha teimosia tomou outra direção. Quero ressuscitá-los, quero arrancar-lhes os olhos, sujar-lhes as mãos e os pés... Maldito lugar comum, quero explodir com isso, quero que eles vivam uma vez na vida e enxerguem o quão horrível e maravilhoso o mundo de fato é. Me entristece essa característica presente nesse tipo de pessoa, quase robozinhos repetindo sempre as mesmas frases, as mesmas falácias, a mesma burrice generalizada. Tenho a sensação de que nunca nasceram e, dessa forma, nunca poderão crescer e enfim formar sua própria opinião. Mas também, quem sou eu? Ainda gaguejo em meus pobres argumentos, ainda me vejo dominada por toda essa raiva que só cala, que só torna o mais racional dos argumentos, sem sentido. Invejo a calma dos adultos, o meu erro é ainda ser criança de mais, emocionalmente falando, principalmente emocionalmente falando.

Gosto das discussões, quando o vulcão de emoções dentro de mim está apagado, quando minha mente é clara e rápida. E não é todo o dia que eu tenho essa sorte. Outro dia perdi uma discussão que virou briga e a minha burrice permitiu que meu irmão continuasse se afundando em seus preconceitos e ingenuidades... Tão novo... E nem um pingo da boa e velha inquietude e não aceitação dos jovens para com sua realidade e mundo. Tão jovem e com ideias tão velhas quanto as ditadas pela minha avó inocentemente racista e machista.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Medos e receios



O medo. Fecho os olhos e não posso abri-los novamente, não posso, não posso. Há um monstro bem diante de mim, posso senti-lo, posso ouvi-lo, se eu abrir os olhos ele vai me pegar, ele vai existir de verdade, enfim, e nunca mais vai embora. Meus braços tremem, quero colocar minhas mãos diante de meus olhos, para me proteger, para poder abri-los e continuar não vendo nada, mas não posso, não posso. Se eu me mexer o monstro vai me pegar, ele está só esperando, só esperando... Por que não vai embora? Imagens horríveis passam diante de meus olhos fechados, vai acontecer comigo, vai acontecer, vai acontecer. Quero pensar em outra coisa, quero dominar minha mente, meu corpo, quem eu sou, mas não posso, não posso. Estou tão assustada que nem chorar eu consigo, o medo me paralisa, o monstro me paralisa. É a primeira vez que eu o sinto fora de mim de um jeito tão forte, não sei o que é pior, ele dentro de mim me expulsando de mim mesma ou fora... me cercando, acuando, aterrorizando.

Não sei o que fazer, não sei o que fazer. Quero gritar por ajuda, quero que alguém me abrace e me tire daquela situação. Mas não posso me mexer, não posso, não posso. Não posso falar, não posso abrir os olhos, logo não poderei mais respirar. É como estar se afogando, sentindo as esperanças te abandonando a medida que você afunda na escuridão. Eu deveria estar escrevendo sobre os medos e anseios que tenho do período que está por vir, quando estarei longe da minha psicóloga e da minha namorada... Mas no fim estou só escrevendo sobre um medo totalmente irracional e irreal. Mas talvez todos os medos sejam irracionais e irreais, não sei ao certo. O que posso dizer? Tenho medo do meu monstro, tenho medo de mim mesma, tenho medo de fechar os olhos, tenho medo de abrir portas e de olhar para os cantos escuros de algum lugar, tenho medo de banheiros, tenho medo do meu gato andando sorrateiro pela casa, tenho medo de ficar sozinha, tenho medo de ser abandonada ou deixada de lado, e tantos outros.

E para cada medo, há a tendência de se criar um comportamento obsessivo, e para cada comportamento obsessivo, uma fuga, que alimenta outras fugas, e geram outros comportamentos e assim por diante. É preciso lutar. Sempre é preciso lutar. Eu preciso me manter forte, independente das coisas que aconteçam a minha volta... Meu mal é ser altamente influenciável pelo ambiente a minha volta. O que posso fazer? Não posso abrir os olhos enquanto o monstro estiver bem diante de mim, pronto para me atacar ao menor sinal de fraqueza.

sábado, 24 de novembro de 2012

Adaptação, superação e força



Sempre achei incrível a capacidade das pessoas de se adaptarem mesmo frente as piores situações e acontecimentos. O fato dos doentes terminais conseguirem continuar a sorrir, ou alguém que perdeu os braços em um acidente conseguir virar um ótimo pintor, segurando o pincel com a boca ou com os pés, ou então alguém que passou por uma extrema depressão e hoje consegue viver melhor que muita gente... Todos parecem estar constantemente superando seus obstáculos, não importa o quão grande eles sejam. E eu costumava pensar que não tinha essa habilidade, que nunca iria conseguir superar meus obstáculos e dificuldades. Não sei se um dia eu vou realmente conseguir superar tudo, mas de um tempo para cá venho notado algumas sutis e importantes mudanças.

No começo, quando meus sintomas começaram a aparecer, o mundo se tornou um lugar infinitamente mais estranho e assustador. Já hoje, nem tanto. Creio ter me acostumado com as mentiras que meus olhos contam, e mais importante do que isso, aprendi a vê-las como mentiras e separá-las da realidade. Hoje, quando minha visão se torna turva, objetos dançam ao meu redor e a realidade parece perigosamente líquida e instável... Eu não entro em pânico, eu respiro fundo e sigo em frente. Vai ficar tudo bem, as coisas sempre voltam ao normal. Demorei muito tempo para confiar na realidade e no fato de que ela sempre volta, mas acho que agora, finalmente, eu conseguir entender.

Acho que é isso que eles querem dizer com "não existe cura, mas existe tratamento". Eu sempre vou ser o que sou, nunca vou ficar totalmente livre dos sintomas e da possibilidade de uma nova crise, mas eu posso trabalhar para me tornar o mais funcional possível. Se eu conseguir me controlar para não entrar em pânico e conseguir seguir em frente, se eu tiver essa força, acho que finalmente vou conseguir sumir na multidão. Talvez não exista uma forma de eu me livrar das marcas nos meus braços e pernas, creio que estejam em torno de 250 cicatrizes, mas, vai ser com muito orgulho que eu vou responder (quando alguém me perguntar sobre elas), enfim, de forma totalmente sincera, que elas fazem parte do passado e não mais ditam o que eu sou.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Me olhe nos meus olhos



Você pode me olhar nos olhos como nunca olhou ninguém? Pode fazer eu me sentir única no mundo? Sei que sim... É fácil, muito mais fácil do que você imagina. E no entanto... Você me fez chorar. Tudo bem, as pessoas erram. Foi o que eu disse para você. É verdade, elas erram e você precisa aprender a perdoá-las. É assim que as coisas são... Mas a maioria das pessoas com quem conversei pareceu pouco inclinada a perdoar esse tipo de erro. Há coisas que nem o tempo cura, talvez fosse algo que eles dissessem. De um jeito ou de outro, houve uma pessoa, um amigo, que me disse que se você me faz tão feliz quanto eu digo que faz, então isso deve significar que você merece uma segunda chance e foda-se a opinião dos outros. Isso mexeu comigo. Eu acredito muito na filosofia "foda-se o mundo, vou seguir meu coração" (não, não é nada tão impulsivo e inconsequente quanto a frase sugere). E foi seguindo esse coração surdo, cego, mudo e manco que eu vivi os piores e os melhores momentos da minha vida. Confio nele independente de tudo, coloco nele todo o meu conforto e segurança a prova, na esperança de que na próxima esquina me espere mais um momento tão bom que apague todas as lágrimas que derrubei para chegar até ali.

E assim eu vou vivendo. Geralmente as coisas dão mais mais certas do que erradas. Apesar de tudo, eu me considero uma pessoa sortuda em muitos aspectos, então gosto de me arriscar. Afinal, o que eu tenho a perder? Então, sim, sim! Por que não? Meu corpo parece ter sido feito para se encaixar em seu abraço e isso sempre me pareceu ter algo de significativo. Dessa vez não fui eu quem caiu... Foi você. Você sempre esteve ao meu lado apesar de tudo. Eu vou provar para você que eu posso ser tão forte quanto você, vou permanecer ao seu lado, vamos levantar juntas, sacudir a poeira e seguir em frente. Vai ficar tudo bem, sei que vai. Eu te amo e em nenhum momento vou deixar de acreditar em você. Exatamente como sei que você me ama e acredita em mim. Posso ver em seus olhos, acho que todo mundo pode. Então, por favor, não abaixe a cabeça nunca, não importa se por vergonha, culpa ou medo, não importa, só me olhe nos olhos como você sempre faz e se orgulhe por me fazer tão feliz.

Cometer erros não torna uma pessoa melhor ou pior, boa ou ruim; a torna, simplesmente, humana.

domingo, 11 de novembro de 2012

Consequências de uma tal festa



Só mais uma noite aparentemente normal. Uma festa, álcool, maconha. Você destruiu minha fortaleza de areia. Mais de dois anos construindo... E uma única noite, um único minuto, para destruir tudo. Como se não fosse importante, como se eu não existisse. Como se eu fosse menos que ninguém para você. Ela é mais bonita? O que ela tem que me falta? Não consigo parar de me perguntar... Será que é mais feminina? Mais confiante? Será que conversa bem? Eu queria... Ser boa o bastante. Ela deve vestir saia e salto alto. Eu sou desajeitada e confusa. Me sinto a pior pessoa do mundo de novo, não consigo nem chorar mais, eu só quero é bater minha cabeça na parede até desmaiar, abrir cortes que sangrem por horas, essas coisas. Me desculpem, meu monstro está solto aqui dentro. Não sei o que fazer, o que pensar, o que sentir. Acho que morri no meio do caminho e não percebi, ou congelei no tempo e não me dei conta. Não sei.

Como... Como você lida com uma traição? Como você segue em frente? Alguém que você amava, confiava, alguém por quem você iria até o inferno para salvar... De repente te apunhala pelas costas. Tento olhar para o que restou da enorme fortaleza que construímos juntas e me pergunto onde eu errei, talvez alguma rachadura, talvez algum buraco, não sei. Me sinto vazia, mais vazia do que nunca. O buraco negro em meu peito sugou tudo o que eu sou. Sinto um bloqueio em minha mente também, não consigo pensar direito, meus pensamentos giram em torno de uma única coisa. Insistentemente. Queria conseguir chorar pelo menos, deixar essa escuridão sair por entre os soluços... Mas não. Eu guardo, guardo tudo... Há certas coisas que as lágrimas não curam, é preciso sangue. Ao menos é o que meu monstro sussurra em meu ouvido.

E agora? Eu não sei... Como você pode fazer isso? Você mesma me disse que nunca me perdoaria se eu fizesse isso com você. Isso não é um pouco injusto? Quero esquecer, deixar tudo para trás, fingir que nunca aconteceu... Mas não posso. Eu confiei em você, como posso confiar de novo? Estou com medo... De você, de mim, do futuro, do que vai acontecer. Eu não quero ser a idiota da relação, a que aguenta tudo calada e que é feita de gato e sapato. Não é isso que eu quero para mim.... Talvez eu já seja a idiota e não nem percebi. Aquele dia... Eu sabia que havia algo de errado, mas mesmo assim engoli meus medos e desconfianças e pensei... Pensei que te amava e que confiava em você e que sabia que você nunca faria nada para me machucar. Eu continuei sorrindo e tentando fazer você se sentir melhor. Eu deveria ter ouvido minha intuição... Mas não, eu sou paranoica de mais, desconfiada de mais, não posso dar ouvidos para meus pensamentos malucos.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Por que continuar a lutar?



As coisas estão bem de modo geral, tirando um dia ou outro que um resquício de algum sintoma vem me incomodar. Mas é relativamente fácil ficar bem quando eu estou afastada de tudo o que me faz mal. Tenho medo do próximo semestre, quando minha vida vai voltar ao normal. Me pergunto o tempo todo se vou aguentar. Tenho dificuldade de reconhecer meus limites, tenho a mania de me sobrecarregar e surtar por isso. É sempre assim, eu quero fazer tudo, do jeito mais perfeito possível. Não tenho base emocional para lidar com o estresse, então minha cabeça entra em parafuso. Por parafuso eu quero dizer: psicótica, impulsiva e autodestrutiva. Ai eu começo a me foder cada vez mais. Da última vez eu fui parar em uma clínica psiquiátrica por isso... Eu não quero ser internada de novo.

Há essa maldita fronteira entre a sanidade e a loucura. Eu preciso enxergar essa linha para conseguir me manter do lado certo. Mas eu não enxergo, ela é tênue de mais, frágil de mais. Qualquer coisinha idiota pode me jogar para o outro lado e estragar meses de trabalho intenso, eu me conheço, eu sei disso. Sei como posso passar do céu para o inferno em questão de segundos. Sei de tudo isso. Sei quantas vezes já caí e pensei em nunca mais levantar simplesmente porque sabia que a próxima brisa me derrubaria de novo. Mas eu levantei, de novo e de novo. Por que continuar a lutar? Era a pergunta que sempre me vinha em mente. Eu não faço a mínima ideia.

Minha doença não tem cura, não há esperança para mim, tratamentos incertos e muitas vezes ineficazes. Minha psicóloga me tirando do fundo do poço e me colocando em pé, como se eu fosse um bebê aprendendo a andar. Minhas pernas tremem de medo, as lágrimas escorrem pelo meu rosto, mas quando olho para trás, lá está ela, e todas as pessoas que me amam, sorrindo para mim. Eu sei que vou cair de novo. Mas, por eles, eu dou um passo a frente. Eu sei que minha vida inteira será uma luta constante contra mim mesma. Mas por eles, eu levanto de novo. A única coisa que eu posso dizer com certeza é que, se hoje eu estou viva, é porque vocês existem. É por isso que eu continuo lutando.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Medos e inseguranças



Eu não entendo porque você faz isso. Eu não deveria pensar desse jeito, eu sei, eu sei. Mas lá vem você de novo. Parece provocar, parece ser de propósito, parece gostar. O que você quer? Quer que eu implore? Quer que eu grite para os quatro ventos? Eu faço o que você quiser. Só pare de bagunçar minha cabeça, de agitar meus sentimentos desse jeito. Eu sou um pouquinho mais frágil do que você imagina, um pouquinho mais sensível. Isso dói, aquilo também, e você não está nem ai. Há um universo inteiro e complexo aqui dentro e eu quero que você me entenda, mas tem sempre alguma coisa, tem sempre uma barreira. O que eu posso fazer? Sinto como se desse mil sinais o tempo todo de como entrar aqui dentro, mas nada adianta. E eu não posso falar com palavras como entrar em minha mente, me conhecer por completo, não é algo que se diz, é algo que se aprende. Você me observa, eu sei disso, isso é bom. Mas as vezes, de repente, tudo o que você parece saber sobre mim some e nos tornamos quase que estranhas, discutindo com as paredes.

Eu tenho medos e inseguranças, diversos. É uma luta falar quando alguém toca em algum desses medos ou inseguranças. É covardia, sei disso, mas é como as coisas funcionam comigo. Eu sou medrosa, estou sempre na defensiva e não tenho nenhuma pele emocional para me proteger. Mas são coisas aparentemente irrelevante aos olhos do mundo lá fora. Ninguém liga. Na verdade ninguém liga para ninguém, a não ser que você caia bem no meio do caminho de outra pessoa de uma forma que ela não possa passar por cima ou desviar do caminho. De qualquer jeito, talvez você se esqueça, talvez só esteja cansada. Tudo bem. A dor passa, cortes fecham, lágrimas secam. O importante é que o que realmente importe não seja destruído. E eu acredito que ele é forte o bastante para sobreviver a essas coisas chatas que vire e mexe vem atrapalhar nossas vidas.

Um dia... Um dia eu espero que você possa me entender por completo e eu espero também te entender por completo. Sei que é possível. Mas a gente é sempre meio egoísta, meio teimosa e cabeça dura. Não passa de uma questão de paciência e tempo. Está tudo bem.

20 anos - Os primeiros de muitos que ainda virão



Meu aniversário está chegando e eu ainda não me acostumei com a ideia de fazer 20 anos. Não me sinto como uma adulta de 20 anos. Me sinto como uma adolescente de 17. Pode parecer pouca a diferença, mas não é. É como se desde o aparecimento dos primeiros sintomas do meu transtorno eu tivesse parado de crescer, congelada no tempo para sempre. Quem me conhece desde aquela época costuma falar que eu amadureci muito, mas eu não me sinto madura. Acho que bem lá no fundo eu continuo a mesma adolescente desencaixada, confusa e instável que eu sempre fui. Talvez todo mundo, na realidade, nunca mude. De qualquer jeito, acho que ao menos aprendi a me controlar um pouco mais, aprendi a pensar um pouco mais antes de fazer alguma coisa. E isso faz toda a diferença. Meus amigos também, aprenderam a me manter longe do álcool, de objetos cortantes e das drogas em geral (menos do cigarro). Isso também faz toda a diferença.

Foi um ano muito difícil. Sei que há coisas pelas quais passei esse ano e coisas que ouvi que eu nunca mais vou conseguir esquecer. Meu psiquiatra falando para meus pais que se eu não estivesse em tratamento desde mais ou menos o começo da minha piora, muito provavelmente eu já teria me matado, a recepção agressiva por parte de um dos pacientes da clínica que eu fui internada, os gritos ali dentro, os choros, os momentos de desespero, a dor constante, os remédios, os xingamentos que eu não conseguia abafar tapando meus ouvidos com as mãos. Foi duro, os dias que antecederam a internação foram difíceis, mas a internação foi muito mais, muito mais do que eu jamais poderia imaginar. Mas tem uma coisa que é certa, eles salvaram a minha vida. Nem todos os dias foram lágrimas e quando foram, algo as recompensou. Os dias longos e intermináveis que eu passei na "casa dos artistas" me deram a força e esperança necessária para que eu pudesse seguir em frente. E ter vivido ao lado de pessoas como eu não só me fez amá-las, respeitá-las e entendê-las, como também fez com que eu olhasse dentro de mim mesma e passasse a ver meu monstro com mais humanidade.

Não há dúvida que o sofrimento de ter sua vida arrancada de suas mãos e ser jogada em uma espécie de prisão é imenso, mas pela primeira vez na vida eu sinto que fui recompensada, que valeu a pena. Posso dizer que esse ano aprendi muitas coisas, entre elas, aprendi que brincadeiras fazem bem para a alma mais do que qualquer crise de choro. E que não importa onde você esteja sempre vai existir alguém para te oferecer um abraço quando a dor estiver forte de mais. Aprendi, enfim, que heróis existem sim, e a única coisa que você precisa fazer é confiar na mão que eles te oferecem. Aprendi que, as vezes, as pessoas que são mais duras com você, são as que mais te querem bem. Aprendi que não tem nada de errado em pedir ajuda quando você precisa dela. Aprendi que ainda há muito para se aprender e que cada ser humano é um universo inteiro, complexo e maravilhoso e que não importa o quanto você se sente desencaixado no mundo, sempre vai existir um lugar que vai fazer você se sentir em casa, um lugar onde você vai ser amado e ninguém mais vai te julgar pelo que você é.

Eu nunca vou esquecer do meu último dia na clínica... Quando todos os outros pacientes correram em minha direção para me abraçar, um por um, antes que eu fosse embora. Obrigada por fazerem eu me sentir tão amada e aceita, obrigada por todo o carinho e apoio. Vocês sempre serão como pais, mães, irmãos e amigos para mim. Foi um bom ano, apesar de tudo... É incrível como as coisas mudam. Em julho eu poderia jurar que minha vida era uma merda e estava extremamente perto do seu fim, hoje me sinto um bebê dando, finalmente, meus primeiros passos. Os primeiros de muitos que ainda virão.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

O fundo do poço



A gente não pensa muito nos problemas que existem pelo mundo afora, até que eles estejam perto de mais para serem ignorados. Então é como se você tivesse levado um soco bem no meio do peito. Falta o ar, dói, é assustador. É a realidade batendo a porta. É a morte de alguém, uma doença um pouco séria de mais, é a notícia de que um conhecido se rendeu as drogas, ou foi pego pela depressão, é um emprego perdido, a falta de dinheiro, de comida, de carinho, de atenção, de tudo. E agora? Eu não sei, ninguém sabe. A vida continua, aparentemente, ignorando o seu mais novo problema do mesmo jeito que você, sem saber, ignorava o problema dos outros. Como pode continuar? Você se pergunta, caindo cada vez mais fundo no abismo que se abriu sob seus pés. E caindo e caindo. Parece não ter fim, não há ninguém nem nada em que ou em quem você possa se agarrar, a luz se torna cada vez mais tênue e o fundo cada vez mais assustadoramente eminente. Então você chega. Ali, onde não há luz, esperança ou possibilidades. É como morrer. Você aos poucos vai se esquecendo do mundo lá em cima, o mundo que você vivia antes do abismo surgir em sua vida. Você esquece.

Aos poucos também, seus olhos vão se acostumando a escuridão. E você vê que não está sozinho. Interessante. Há outras pessoas aqui, algumas ainda cegas pela escuridão, outras já há muito acostumadas. Ninguém fala, ninguém estende uma mão amiga, mal se encaram. Parece que cada uma das pessoas aqui embaixo já tem problemas de mais para se preocupar para se importarem com os outros que ali estão. Você se sente intimidado ao tentar abrir a boca, então não diz nada, apenas anda de um lado para o outro sem saber o que fazer. Seu problema ainda está ali, chegar ao fim do poço não mudou nada, não há uma resposta aqui, não há uma solução, não há nada. A não ser um bando de pessoas exatamente como você, perdidas, sem esperanças ou perspectivas. Quando você está prestes a desistir, sentar no chão e apenas esperar pela morte, você olha pra cima na esperança de ver alguma luz, por menor que seja. Você não vê luz, mas vê algo que te surpreende. Há uma ponta de uma corda, a um pouco mais de dois metros do chão. Você pula tentando alcançá-la, mas ela ainda está longe. Mas não tão longe assim, se alguém o ajudasse você conseguiria alcançá-la.

Você só precisa de uma pessoa. Só uma. Uma mão amiga. E todos os seus problemas estariam resolvidos. Você voltaria a superfície e poderia continuar a vida como todo mundo. Mas basta só você olhar para os lados para saber que ninguém ali te ajudaria. Estão todos fechados de mais em seus próprios mundinhos e problemas para ouvir quem quer que seja e o que quer que seja. Você grita que há uma corda, que há um jeito de sair de lá. As pessoas murmuram irritadas e se afastam. Você corre para uma delas e a chacoalha dizendo que ela precisa te ajudar. Seus olhos vazios não dizem nada em resposta e quando você a solta, ela da meia volta e também se afasta. Qual o problema dessas pessoas? Por que não lutam? Por que não tentam? Estão todas cegas, doentes e perdidas. O que você poderia esperar?

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Casos de família



Eu só queria conversar um pouco... Eu só queria alguém capaz de me ouvir um pouco e entender a dor que se esconde nas entrelinhas. Eu não estou bem. Parece que eu estava conseguindo, parece que as coisas estavam começando a caminhar bem, não é mesmo? Agora sinto como se tivesse sido lançada sem dó nem piedade para meu lugar de origem. Me sinto apagada, morta, alguém sem importância, uma estranha dentro dessa maldita casa. E eu não entendo. Não entendo o que fiz de errado. Eu estava me esforçando, de verdade. O que eu fiz de errado? Eu tento e tento.... E não consigo. Eu estava começando a me acostumar um pouquinho... A fazer parte, a construir um laço ou outro, mesmo que tênue. Agora estou de novo sentindo vontade de vomitar só em pensar nessas coisas. Eu quero ir embora, eu preciso ir embora. Sinto vontade de me matar só em pensar que ainda vou demorar mais de dois anos para me tornar independente.

Meu peito dói, minha gargante e minha cabeça, que eu acabei de socar até as lágrimas pararem de cair e meu coração ficar vazio. É isso que dá quando a gente abre as portas, quando a gente se permite confiar um pouquinho em alguém. A grande maioria das pessoas nunca vão ser confiáveis, eu deveria saber disso muito bem a essa altura da minha vida. Me sinto uma idiota agora. Não quero mais tentar, não quero nunca mais. Eu cansei, isso aqui não tem jeito, não tem conserto. Isso nunca vai dar certo. Nunca. E, escreva o que eu digo, isso aqui ainda vai gerar coisas muito ruins enquanto existir. Estou cansada. Estou decepcionada. Profundamente decepcionada. Bom, já estou de volta no meu lugarzinho, chamando o menos de atenção possível, todos podem continuar suas danças mentirosas sem tropeçarem em minhas inconvenientes verdades.

Boa sorte para os que ficam, eu já não tenho nada a ver com isso. Adeus.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Raiva



Senti vontade de destruir algo bonito. De repente as pessoas me enojam. Não suporto a solidão. Por favor me deixe sozinha. Eu preciso destruir algo bonito. O que eu daria para ter uma gilete aqui comigo. Tem algo queimando dentro de mim. E queimando, e queimando... Não sei o que fazer, para onde ir. Não, não vou tomar nenhum calmante, não, não vou ligar para ninguém. Fecho os olhos, mais consciente do que nunca no que eu sinto. E o que eu sinto é tão puro que nem motivo precisa ter. Irracional, constante. Meu monstro se atirar em direção as grades que o cercam, ele quer sair. Ele precisa sair. O que eu daria... Meu corpo inquieto, minhas mãos nervosas, meus pensamentos tão confusos quanto claros. Só um pouquinho, só um pouquinho. A escuridão faz promessas tentadoras. Não acredito em diabos, mas se acreditasse, eu seria um deles. Um anjo caído, que linda história. No fim, qualquer anjo é meio diabo, e qualquer diabo é meio anjo. Odeio maniqueísmo.

Eu não vou fazer nada, não hoje, não agora. Mas algo sussurra dentro de mim. Um dia. Eu não estou livre, eu nunca vou estar livre. Levantar da cama continua sendo uma luta que eu venho perdendo cada vez mais. Por que estou viva? Para que levantar? Para que ir nessas aulas que eu estou fazendo? Para que se esforçar? As vezes eu levanto, mas na primeira pedra que aparece em meu caminho, eu me arrasto de volta para a cama. E lá, assim que eu fecho os olhos, deixo com que minha mente caminhe livre pelo mundo dos sonhos. Crio as histórias mais complexas e maravilhosas. Eu não quero acordar, não, não. Quero continuar vivendo nesse outro mundo. Esse mundo de cá... Eu não me encaixo, eu não me sinto bem, tenho medo... O mundo de lá é lindo e tentador. Eu posso ser qualquer coisa, posso fazer qualquer coisa.

Sinto vontade de chorar agora. O que eu estava sentindo passou e agora só restou a tristeza. No fim eu sempre encontro a tristeza. Há um buraco no meu peito, que nunca pode ser preenchido. Fecho os olhos e dessa vez deixo com que as lágrimas escorram. Até meu monstro se encolhe dentro de mim... O mundo inteiro é dor. Por favor... Me tire daqui. É a única coisa que eu consigo pensar.

Sobre estar viva e a importância das aparências



Eu queria escrever mais. O blog se tornou muito mais devagar desde que eu fui internada, o que me irrita e me faz perguntar o que está acontecendo comigo, já que nem escrever (uma das minhas mais preciosas obsessões) tem conseguido me manter concentrada. A verdade é que algo importantíssimo me aconteceu nos dias em que eu passei trancada na casa dos artistas. E eu temo pelo que seja pois ainda não acredito que tenha descoberto o que é.

Mudanças são sempre assustadoras, não importa se para melhor ou para pior. Então, sim, tenho medo. Dessa nova vida esquisita e perdida, desse novo eu, mais controlado, mais anestesiado, adestrado. Os dias são lentos e torturantes e a cada dia eu sinto algo impaciente dentro de mim, meu monstro, claro, impaciente e inquieto. Ele quer sair. Ele quer ação. Ele quer sangue escorrendo e um turbilhão de sentimentos e pensamentos. A genialidade ou a ilusão de. A loucura. A paixão. Sinto falta dele, deus e o mundo que me perdoem, mas sinto falta do meu monstro. Ou de mim mesma, não sei mais. Sei que quem fala nesse momento é a Sabrina Borderline, conheço bem todos os traços dessa personalidade, ela quer a dor, as lágrimas, a raiva, a desculpa para destruir tudo a sua volta. Ela não liga nem um pouco para ela mesma ou para mim, a Sabrina normal. Ela é egoísta e confusa, se faz de vítima quando é o carrasco, se faz de carrasco quando é vítima. Afinal o que é um carrasco, se não uma vítima? E o que é uma vítima, se não um carrasco?

Eu não sei, eu não sei. Estou cansada desse nada, dessa falta de objetivos, dessa estagnação. E quando surge algum objetivo, alguma atividade, eu me frustro, não consigo realizá-la. Nada é bom o bastante. Quero chorar as vezes e não posso, porque sou vigiada o tempo todo. Se eu chorar vão achar que eu estou piorando de novo, que eu estou deprimida, que a qualquer momento eu vou voltar a me cortar. Ora, me deixem em paz, meu peito dói, chorando as lágrimas que morrem em meus olhos, minha garganta dói, chorando as palavras que morrem antes de chegarem em meus lábios. Tudo dói, incomoda, rasga. Quero sair correndo, para um lugar onde nada disso exista. Quero morrer, ou viver, não sei ao certo. Me falta alguma coisa, uma coisa muito importante.... Eu devo ter perdido em algum momento, mas não consigo lembrar o que é, onde perdi, como perdi... Só sei que me faz falta. Uma falta terrível.

E nesse momento não consigo me sentir viva. Essas lágrimas idiotas insistem em cair, mas eu não vou parar de enxugá-las. É preciso parecer bem, não necessariamente estar bem, só parecer... Se eu parecer bem eu ganho os privilégios de poder fazer o que todo mundo pode fazer: viver. Eu quero poder viver e ter uma vida normal, por mais que eu não consiga me sentir assim. As aparências importam. Eu gosto da liberdade, mesmo que em meu coração eu seja a pessoa mais presa que eu conheça. E eu não me sinto nada viva. Quero a dor física, preciso da dor física. É só ela que consegue me dizer que eu continuo viva e que as coisas vão ficar tudo bem. Ela está bem aqui, comigo, sempre que eu preciso, ela não me vira as costas, ela não diz adeus, ela nunca está ocupada com outra coisa. Mas é melhor eu calar a boca antes que alguns dos guardas que me vigiam decidam que eu estou piorando, ou falando como uma viciada, ou sei lá o que.

domingo, 7 de outubro de 2012

Morto-vivo, camisas de força e anestesias



Talvez seja só egoísmo meu, mas eu estou tão cansada de ser sempre a culpada de tudo que por um instante eu não estou nem ai e a raiva e dor acumuladas durante minha vida inteira são canalizadas para uma única pessoa ou situação, que se eu fosse parar para pensar talvez nem merecesse tanto assim da minha atenção. Dói, uma dor anestesiada pelos tantos remédios que eu tomo, mas mesmo assim uma dor, recorrente, teimosa, aguda. Posso sentir que poderia explodir, posso sentir o quão perto estou disso, como se sentisse o vento a beira de um abismo, mas aqui também algo me segura, acredito novamente serem esses malditos (malditos?) remédios, essa camisa de força em meu cérebro irrequieto. Sinto falta de muitas sensações que costumavam ser tão insuportáveis e me levavam a loucura. Me sinto uma morta-viva sem elas, mas acredito que esse é o preço que eu tenho que pagar para ter o mínimo de estabilidade na vida. As coisas nunca são como a gente gostaria que fossem, infelizmente.

De qualquer jeito, surge um problema. E meu monstro, tão longe, tão perto, se mexe incomodado em sua pequena jaula de Quetiapina, mas eu não faço nada, parece que nem sofrer eu consigo. O problema continua exatamente aonde ele estava e eu não estou lidando com nada. Tenho vontade de fugir, de sair correndo, de jogar todos meus remédios na privada e dar descarga. Meu psiquiatra e minha psicóloga dizem que eu estou bem, mas o que significa "bem"? Eu só me sinto morta. Sinto falta de mim mesma. Isso é ser normal? Isso é ser estável? Se sim, eu já não tenho mais tanta certeza se é isso que eu quero. Eu quero viver, quero fazer as pessoas rirem, quero poder beber a porra de um copo de vinho sem que isso soe como o pior crime que eu poderia ter cometido no mundo. Quero ser normal de verdade e poder cometer pilhas de erros como todo mundo sem que isso seja uma grande coisa. Mas não, eu não posso. As pessoas dizem que eu deveria exigir menos de mim mesma, mas o que eu posso fazer se cada pequeno erro ou deslize meu já quase me custaram minha vida? Todos os dias eu preciso estar atenta e arranjar forças sabe-se deus onde, porque em questão de segundos eu posso piorar drasticamente, nunca se sabe. Não há folga, ninguém pode fazer isso por mim. Não posso errar em momento algum, não posso fraquejar. Meu monstro, minha doença, está sempre a espreita, sempre esperando o momento certo para assumir o controle.

É uma guerra e não importa muito quem vença, no fim eu sempre saio perdendo.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Feita de cristal


As coisas "melhoraram" desde que eu fui internada, todos me tratam como se eu fosse feita de cristal. As pessoas que costumavam me deprimir e me machucar de repente viraram todas sorrisos e gentilezas. E eu estou confusa porque não sei até onde toda essa atenção é verdadeira ou não. Me sinto uma idiota quando vejo que eles me tratam diferente. Eu não quero ser tratada diferente. Quero ser tratada como uma pessoa normal, porque só assim eu vou conseguir me tornar realmente uma pessoa normal. Mas não é isso que eles veem, eu sei disso, o que eles veem é só uma garota problemática e doente, que sempre vai ser assim. Outro dia eu perguntei para minha namorada se algum dia eu teria a chance de conquistar os pais dela e fazer com que eles gostem de mim e aceitem nosso relacionamento. Ela disse que não, pelas cicatrizes em meus braços, pelos remédios que eu tomo, enfim, por eu ser nada menos do que eu mesma.

Por que? Por que é tão difícil para eles me enxergarem por trás da minha doença? Eu estou bem aqui. Eu também posso ser legal, eu também posso ser engraçada, ter amigos, estudar, trabalhar, construir uma família, viver. Eu posso, eu sei que posso. Não, eu não preciso ser tratada como normal para me tornar normal, eu já sou normal, nunca deixei de ser, mas preciso ser tratada como tal para me sentir dessa forma. Dói ser julgada dia após dia por algo que eu não posso evitar. Eu sou mais que estas cicatrizes, eu sou mais que um diagnóstico, mais do que os remédios que eu tomo. Meu nome é Sabrina, tenho 19 anos e uma vida inteira pela frente. É tão difícil assim de entender?

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Sem heróis



Os adultos nunca escutam. Eu sempre soube disso. A criança que eu e muitas outras pessoas foram, foram sistematicamente ensinadas a permanecerem em silêncio. Ninguém escuta as crianças, é um fato, nunca entendi o porque mas é assim que as coisas são. Enquanto, ano após ano, eu era perseguida das mais diversas formas, eu sentia que a culpa era minha e eu que tinha que resolver isso sozinha. Eu nunca contei para ninguém porque sabia muito bem que heróis não existiam, pelo menos não no meu mundo. Eu não permitia a mim mesma sonhar porque não suportaria o peso de ser mais decepcionada do que eu já era. Aos 6 anos eu já desprezava os contos de fada, aos 8 já sentia que não era mais uma criança e nem me lembrava de um dia já ter sido uma. O mundo é um lugar duro e solitário de mais. E quando você cresce como eu cresci, você não consegue enxergar que o mundo e as pessoas não só podem como deveriam ser bons.

Eu demorei muitos anos para conseguir confiar em alguém, uma confiança frágil e quebradiça, mas um passo enorme para mim. Eu gostaria que as coisas tivessem sido diferente, eu gostaria que um adulto tivesse olhado por mim, tivesse percebido o quão mal as coisas iam para mim. Eu gostaria que alguém tivesse quebrado minha barreira de silêncio, me abraçado e me explicado que aquilo que eu passava era errado e que eu não precisava nem deveria passar por aquilo. Mas ninguém fez nada. É por isso que nunca acreditei em heróis, nunca contei com ninguém. O mundo me decepcionou muitas e muitas vezes.

Eu costumava odiar os adultos e a força que eles exerciam sobre as crianças, quase todos tiranos, mascarados ou não. Todos inúteis para mim. Como podem ser tão cegos? Como podem errar tanto ou serem tão maus e egoístas? Como podem negar a realidade bem diante de seus olhos? Eu nunca entendi. Enquanto a casa desabava eles só se preocupavam em gritar baixo para os vizinhos não ouvirem. "O que os vizinhos vão pensar?". Foda-se o que os vizinhos vão pensar. Esse está longe de ser o problema. Nunca consegui entender isso. Será que as pessoas emburrecem quando crescem? Eu costumava pensar que sim. Talvez.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Psicose



Continuei andando, mesmo sem sentir estes pés como sendo meus e o mundo estando, aos meus olhos, turvo e irreal. Está tudo bem, repito para mim mesma. Tenho vontade de estender os braços e tatear meu caminho a frente, como uma cega, isso faria eu me sentir um pouco mais segura, não sei direito porque. Mas eu me seguro para não fazer isso, não quero que as pessoas na rua me olhem como se eu fosse louca. Eu não sou louca, eu tenho uma doença, é diferente, certo? Tento não ter medo. Vai ficar tudo bem. Sinto vontade de chorar às vezes. Vai ficar tudo bem... Eu só queria alguém que visse e sentisse o mundo como eu agora, só para eu não me sentir tão sozinha. Vai ficar tudo bem, eu só não posso entrar em pânico. O mundo vai voltar ao normal, não vai? Eu sei que vai.

Tento não olhar para meu próprio corpo, se eu olhar eu sei que minha mente vai se desligar mais ainda do mesmo. Tento me concentrar em objetos a minha volta, me distrair de alguma forma de todas essas sensações, mas os objetos dançam ao meu redor, sutilmente, de um lado para o outro, para cima e para baixo, se aproximam e se afastam. Me sinto Alice no País das Maravilhas, em um sonho bizarro ou em algo do tipo. Nem fechar os olhos para encontrar refúgio eu posso, porque a cada vez que eu pisco, minha consciência ameaça se apagar. E eu não sei por quanto tempo ela ficaria desse jeito caso acontecesse, como já aconteceu. Pareço tão perto de perder o controle...

Nada do que eu vejo é o que é, nada do que eu sinto é o que é e talvez, um dia, nada do que eu ouço também. Quem pode me garantir o contrário? Tento não ter medo, e seguir em frente. O mundo desmanchando bem diante de meus olhos. Vai ficar tudo bem. É só que, às vezes, eu tenho vontade de chorar. Eu só queria ter controle sobre meu próprio corpo, ou ao menos sentir que ele me pertence e que eu estou segura aqui dentro. Mas não estou. O mundo é estranho e hostil, não tenho certeza de nada, a não ser que existem monstros lá fora. E aqui dentro.

Saudade



Sinto sua falta, eu acho. Não uma saudade normal, algo dilacerante, algo destrutivo, sei lá. Queria que seus olhos só vissem a mim, isso é um pouco louco? Talvez... Eu preciso parar com essa coisa meio simbiótica, essa tendência a me agarrar e não largar nunca mais. O que posso fazer? Sinto sua falta. Não, não, digo para mim mesma, está tudo bem, ela continua ao seu lado mesmo que não fisicamente. Por que tanta dor então? Por que esse vazio? Não entendo. Sinto sua falta. Às vezes você parece tão distante que os momentos em que estávamos tão perto já parecem fazer parte do passado. Isso é verdade? O desespero se aproxima e eu preciso te ter de novo, só para saber, só para ter certeza, só para eu poder respirar em paz novamente. Acho que acabei por me tornar meio que vítima da sua insegurança e inconstância, e mesmo que você tenha mudado (eu realmente acredito que você mudou muito nos últimos dois anos), eu ainda temo pela volta da pessoa que eu conhecia antes de tudo acontecer.

Você vai continuar ao meu lado? Te observo de longe... Aonde quer que você vá você é o centro das atenções, sociável, falante, engraçada e inteligente. Eu sumo em meu canto, não converso com ninguém, não sou engraçada nem sei falar nada inteligente. Nós somos tão diferentes, por que estamos juntas? Eu não sei, só sei que a cada dia eu te quero mais e mais. Gostaria de congelar alguns momentos, gostaria que o tempo não os estragasse... Sinto sua falta. O que posso fazer? É só que às vezes você parece tão distante... Queria ler por trás de seus olhos, entender seus sentimentos, sonhos e medos. Me deixe entrar, quero sussurrar em seu ouvido, mas as palavras morrem antes que possam se formar em minha boca. Eu te amo. Isso eu posso dizer e eu torço para que seja o bastante, para que diga tudo o que eu quero te dizer. Você diz que me ama também, eu te abraço e o mundo está justamente como deveria estar.

Por favor, nunca vá embora.

sábado, 8 de setembro de 2012

O passado que te persegue



O passado está logo ali, na esquina, no amanhecer, no entardecer, no presente e no futuro. Ele quer comandar a sua vida, limitar suas escolhas, destruir suas certezas. Ele não vai desistir. Dia após dia, não há escapatória, não há alternativa. Ele virá. Ele sempre vem. E você precisa enfrentá-lo, sim, enfrentá-lo todos os dias. Você não pode mais tapar os olhos e fingir que ele não existe, que não está destruindo sua vida aos poucos, porque ele está. E vai continuar caso você não faça nada. Por outro lado você não sabe ao certo o que fazer, como lidar com tudo aquilo, você se sente impotente porque o que vem lá de trás, vem com tudo, com todas as armas, te cerca por todos os lados e faz você se sentir como uma criança indefesa como há muitos anos atrás. É para isso que ele ainda está vivo, para te destruir, para te deixar para baixo e te impedir de pensar no presente e no futuro.

Você precisa se mexer, você sabe disso, há um bom tempo você sabe disso. Os anos de fuga e negação acabaram, a verdade bate a porta, te soca bem no peito, abre seus olhos à força. As lágrimas escorrem pelo seu rosto e não há ninguém no mundo que pode te ajudar. Solidão, dor, escuridão. Você pode gritar, chorar, reclamar, não importa, o passado vai continuar bem ali e você precisa aprender a lidar com ele de alguma forma, seja ela qual for. E é nesse momento que algumas pessoas se perdem. Há diversas formas de se lidar com algo difícil, infinitas, de verdade. Álcool, drogas, automutilação, enfim, vícios em geral. Você pode se perder muito, muito mesmo, mas há outras alternativas, sempre há, por mais que as vezes essas sejam as mais difíceis de serem vistas no pequeno horizonte proporcionado pelo passado.

Você pode nunca vê-las, você pode seguir direto para as mesmas sem nem pensar no que sempre parece o caminho mais fácil e prazeroso. O que faz o caminho de uma pessoa ser tão diferente da de outra? Não sei. O acaso, personalidade, vivências, quem pode dizer? Tudo isso, nada disso. De qualquer jeito, somos todos sobreviventes, ao menos enquanto continuamos de pé frente a tamanha dor. Não acredito que alguns são mais fortes que outros, não... Diferentes, sim, não melhores ou piores. Cada cérebro encontra seu jeito de se lidar com o que quer que te assombre no passado, seja esse jeito saudável ou não. Não acho que isso defina força emocional, uma pessoa viciada em crack, com a vida arruinada pode ser extremamente forte e alguém que nunca colocou sequer um gole de álcool na boca, pode ser extremamente fraco. Cada um é cada um e por mais que as experiências pelas quais você passa ajudam a definir quem você é, as mesmas não funcionam necessariamente como sentenças de que você será isso ou aquilo, ou passará a vida sofrendo ou o que quer que seja. É importante saber a vida é feita, acima de tudo, de escolhas e que sempre há outra alternativa, por mais que você não a esteja vendo.

Tédio e expectativas para esse semestre atípico



Os dias passam lentamente, um exatamente igual ao outro. Me sinto paralisada no tempo e espaço, enfurnada em meu pequeno quarto quente e sufocante. Impossível não bocejar, difícil sair da cama de manhã. A gente sofre com o muito, mas se esquece que o pouco é quase tão nocivo quanto ele. De vez enquanto alguém interrompe minha pseudo-paz, ou tédio, escancarando a porta do meu quarto por alguns momentos, geralmente para dizer alguma besteira qualquer. Meu coração dispara como se um ladrão estivesse mirando com sua arma em minha cabeça. Um fluxo de pensamentos repetitivos toma minha mente. Não, não, não, não, não. Tenho sérios problemas com contato social. Estou muito melhor do que estava antes da internação mas continuo sendo um macaco no que diz respeito as relações sociais. Tenho medo de gente, não posso evitar. Tenho medo especialmente de lugares com muitas pessoas, me sinto intimidada, julgada, observada, é assustador.

De um jeito ou de outro eu preciso fazer algo da minha vida. Não é saudável, de forma alguma, ficar tanto tempo sem fazer nada. Foram só duas semanas fora da clínica sem fazer nada especificamente e eu já sinto uma dificuldade enorme para começar qualquer coisa. O desânimo toma conta de tudo e então você percebe que passou os últimos dias fazendo absolutamente nada, a não ser coisas inúteis na internet. Me sinto mal só de pensar em quanto tempo eu estou perdendo por causa dos meus problemas psiquiátricos. Eu já costumava me sentir atrasada na escola por ser um ano mais velha do que meus colegas na mesma turma, agora então...

Vai ser um semestre inteiro só de atividades extra-curriculares, quase passa-tempos se comparados a faculdade em si. Cursos e mais cursos onde a exigência é mínima ou inexistente, vai ser um semestre bem estranho, quer dizer, já está sendo. Justo para alguém como eu que adorava se sobrecarregar de coisas para fazer, e responsabilidades e etceteras... Bom, a gente tem que se adaptar com o que a vida nos dá. Hoje, minha faculdade está trancada e eu não tenho como voltar até o semestre que vem, então vou fazer o que antes não restava tempo para. Preciso me concentrar no meu tratamento também, também não, principalmente. Ah! Sim, as pessoas... Tenho medo de salas de aula, ou classes. Odeio aquele momento definitivo em que você precisa abrir a porta da sala e entrar e todos os outros alunos já estão lá dentro, ou seja, TODOS vão olhar para você. Só de pensar me dá arrepios, quase desisti de vários cursos só por causa desse maldito momento. Sim, o tratamento. Preciso perder todos esses medos idiotas e essa falta de vontade de enfrentá-los. Bom, tenho um semestre inteiro pela frente.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Medos



Quando se começa algo novo é natural termos medos. O medo é natural, se render à ele não. Tenho muitos medos... Medo do que as pessoas vão pensar quando descobrirem que sou quem sou e passei pelo que passei, medo de não me encaixar em qualquer ambiente ou grupo de pessoas, medo de nunca conseguir falar o que quero, penso ou sinto, medo de olhar nos olhos, de ser julgada injustamente. Tenho medo da injustiça, claro, tenho medo de pessoas más, de homens, principalmente. Medo de lugares muito cheios e lugares muito vazios, medo de dormir de noite quando todo mundo já foi dormir, tenho medo de não ser levada a sério, de gente gritando perto de mim ou comigo, tenho medo de pegar metrô, ônibus e táxi, tenho medo de pessoas perto de mais ou do toque de um estranho. Tenho medo das coisas que vejo e que não deveria ver, tenho medo das lembranças, tenho medo de qualquer coisa que possa me lembrar coisas ruins, tenho medo de certos tipos de olhares e formas de falar. Tenho medo de viver, de perder alguém importante, de ser abandonada ou me sentir abandonada em qualquer momento.

E no entanto a gente precisa continuar de alguma forma. Eu fujo das pessoas, fujo de muitas situações que me fazem tremer de nervosismo só de pensar, mas mesmo assim, nunca me rendi a uma cama 24 horas por dia... Imagino que isso seja bom. Mas preciso de mais coragem. Coragem e mais coragem... e força, muita força. É difícil, fico repetindo o tempo todo que é difícil, mas mesmo assim sinto que as pessoas a minha volta não entendem. Talvez elas não devam entender mesmo. Ontem pensei que nunca mais iria conseguir sair do banheiro porque o medo me tomou de tal forma que eu pensei que iria morrer ali mesmo. É algo inexplicável que te tira quase todas as alternativas a não ser aquelas consideradas autodestrutivas. Você PRECISA bater a cabeça na parede porque se não aqueles pensamentos nunca vão te deixar em paz, você PRECISA se arranhar, se bater e se cortar. Lutar contra essa "necessidade", quando sua mente se torna um caos incontrolável, é muito difícil.

Mas as pessoas não entendem. Elas pensam que você só precisa se esforçar mais um pouquinho, pensam que você não está fazendo o bastante, que é sim possível controlar isso ou aquilo. Não é assim que as coisas funcionam, mas te dizem tanto isso que para não criar mais atritos você abaixa a cabeça e concorda que vai se esforçar melhor da próxima vez. Fazer o que? Sim, sim, prometo que vou me esforçar. A raiva queimando em sua garganta. Prometo, prometo. Vamos mudar de assunto agora, vamos?

Diga a um daltônico que basta ele se esforçar para ver as cores certas, diga a um diabético que basta ele se esforçar que seu organismo vai conseguir lidar com o açúcar... É um absurdo. É assim. Entendem? Você não pode pedir para um bipolar se esforçar para controlar seus picos de humor, você não pode esperar que um depressivo saia da cama só pelo seu esforço ou mandar um esquizofrênico sair de um surto psicótico porque ele quer. Não é assim que as coisas funcionam.

domingo, 2 de setembro de 2012

2 anos




Já faz dois anos desde aquele dia em que você me beijou de repente e mudou minha vida. Eu te amo, mais do que nunca amei pessoa alguma. Eu realmente não sei onde estaria sem todo o seu amor, carinho e apoio. Obrigada por existir e estar em minha vida, por me aguentar nesses dois anos e não me abandonar nem em meio a minha pior crise. Estar com você é como viver em um mundo onde os problemas se tornam menores e superáveis, não importa o quão grandes inicialmente eles parecessem ser. Não! Estar ao seu lado é ter forças para suportar o pior problema do mundo, a pior dor, o pior sofrimento, e não torná-los menor, mas conseguir resolvê-los, mesmo que essa "resolução" seja só, inicialmente, temporária.

Quero passar todos os dias da minha vida ao seu lado, não me importo se isso possa parecer um pouco precipitado. Eu senti isso desde a primeira vez que seus lábios tocaram os meus, foi como se algo finalmente se encaixasse, como se minha vida tivesse começado a fazer sentido. Você sentiu algo parecido? Sempre me pergunto... Sabe? Que aquele momento foi especial? De um jeito ou de outro, queria me desculpar por não ser a melhor namorada do mundo, por não poder ser tão forte o tempo todo. Você que me apoia tanto... E eu sempre precisando cada vez mais de apoio. O que eu mais queria era poder ser um pouquinho mais como você, mais forte, mais independente... Queria ser a melhor namorada do mundo, só para você.

Eu espero que um dia eu possa te fazer feliz como você me faz. Te amo muito. Feliz dois anos de namoro.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Esquizofrenia



Muitas pessoas eram esquizofrênicas na Casa dos Artistas. E por algum motivo, sempre que eu estava em uma das minhas crises lá dentro, os enfermeiros me perguntavam se eu estava ouvindo vozes. E mesmo repetindo dia após dia que eu não havia começado a ouvir vozes, eu sai de lá com o diagnóstico de Esquizofrênica e Borderline. Não sei direito o que isso pode significar, pode até mesmo não significar nada, mas é um pouco assustador. Agora, todos os dias quando vou dormir, as imagens das coisas que vi na clínica passam por minha mente e eu me pergunto se no dia seguinte eu vou ouvir alguma coisa que não existe, essa voz que levava tanta gente ali dentro a loucura, que obrigava os enfermeiros a amarrarem os pacientes em suas camas enquanto eles gritavam e se debatiam.

Eu também tive que ser contida um dia, mas eu não precisava de uma voz na minha cabeça para me enlouquecer ou me obrigar a me machucar. Meu monstro fazia isso muito bem, ele assumia o controle. Meus delírios não eram auditivos, eles são mais sensoriais e visuais. Não acho realmente que eu possa julgar um sintoma como sendo pior do que outro, mas na minha cabeça, ouvir vozes ficou como o último sintoma, um dos mais graves, um sinal de que você está perto de chegar em algo parecido com um "fim", onde os transtornos mentais atingiriam seu grau de gravidade máximo. Eu sei que cientificamente falando, isso não é verdade, mas como lá na clínica "ouvir vozes" eram uma das coisas que os enfermeiros mais se preocupavam, isso ficou organizado na minha cabeça dessa forma.

É por isso que todo o dia, agora, eu vou dormir me perguntando se eu vou acordar no dia seguinte ouvindo vozes. Me pergunto se sou mesmo esquizofrênica, se esse diagnóstico está certo, porque se estiver, eu posso esperar uma crise muito pior, porque ela com certeza virá, mas se o diagnóstico não for esse, eu posso descansar tranquila, porque, aí sim, minhas chances de continuar bem são grandes. Eu não deveria me importar tanto com isso, deveria deixar a vida correr do jeito que for e o que for será, mas não consigo evitar. Me sinto meio paranóica, eu continuo com vários pequenos sintomas, como se os remédios ainda não tivessem conseguido dar conta de todo o transtorno mas eu não sei se devo falar sobre eles, se devo me preocupar com eles, se com o tempo eles vão sumir... Não sei. Fico só especulando, me perguntando se vou continuar bem, se as coisas vão dar certo e o que há de errado comigo. Como será minha vida? Onde estarei quando tiver a idade da maioria das pessoas lá da clínica? Sendo internada pela segunda vez? Quarta vez? Oitava vez? Espero que não. Todos na clínica me diziam que eu era nova de mais... E já fazia dois anos que meu médico e minha psicóloga adiavam a data em que eu teria que ser internada. Se aos 17 eu já precisava de uma internação psiquiátrica, o que devo esperar quando tiver 30 ou 40? Eu não sei. Espero nunca começar a ouvir vozes, nunca mais precisar voltar a Casa dos Artistas ou qualquer outra clínica. Eu só quero que as coisas fiquem bem o suficiente para eu conseguir lidar com elas sozinha e não presa em um outro universo altamente controlado.

domingo, 26 de agosto de 2012

Recomeço



É tempo de começar de novo. De renovar as esperanças e retomar as forças. Ainda me sinto muito perdida e lerda. Na casa dos artistas o tempo parecia não passar, cada dia era uma eternidade de absolutamente nada. Aqui fora o tempo voa, há coisas de mais para se fazer em tempo de menos. Aqui tudo é em excesso, informação, barulho, imagens, sensações... No primeiro dia, quando voltei, quase enlouqueci ao ligar o computador e o celular. Fui bombardeada por tantas mensagens e bipes que pensei que nunca ia conseguir ver tudo o que deveria ter visto em um mês offline. Agora aos poucos estou voltando a me acostumar com essa loucura (ironia?) que é o mundo dos normais. Logo a vida que eu conheci na clínica vai se tornar distante e irreal, como sempre deveria ter sido. Não podemos nos acostumar muito a aquele universo controlado, corremos o risco de nunca mais conseguir voltar. Alguns realmente não conseguem voltar. Eu entendo essas pessoas, os viciados em internação, do mesmo jeito que entendo os internos desesperados pela liberdade. Há essas duas situações, por um lado queremos permanecer internados pois ali é um mundo pequeno e controlado, muito diferente do mundo real, enorme e assustador, ali as pessoas nos aceitam como nós somos, ali ninguém te julga pela sua "loucura", somos todos loucos, somos todos iguais, é fácil se sentir em casa, se sentir acolhido e compreendido, por outro lado, é uma prisão, parece que estão te punindo, como se você fosse um criminoso perigoso, te tirando uma quantidade enorme de direitos. O clima também é quase sempre deprimente, não é exatamente um lugar legal de se ficar, são problemas de mais reunidos em um lugar muito pequeno.

É, eu entendo os dois lados. Sofri muito lá dentro, mas também sofro muito aqui fora. De um jeito ou de outro, eu espero nunca mais cair tão fundo ao ponto de precisar de novo de uma nova internação. Eu espero que eles tenham acertado no diagnóstico dessa vez, nas medicações e em suas dosagens, para que nunca mais seja preciso aumentar nada. Espero também que meu transtorno não se desenvolva mais e que eu piore, ou que os medicamentos parem de fazer efeito com o tempo. Eu espero, enfim, que essa internação tenha sido um ponto final na minha vida, o momento em que eu deixo para trás todo o ciclo de melhoras e pioras em que eu estava presa e passe a conseguir a tão desejada estabilidade. Eu quero ficar bem e ter uma vida normal. Nem que para isso eu tenha que ficar um semestre em tratamento "intensivo". Antes da internação, eu não estava acreditando que um dia poderia ser feliz e ter uma vida normal.... Lá dentro eu vi que havia pessoas piores do que eu e que mesmo assim conseguiam ter uma vida consideravelmente "normal". Enfim, eu pude ver que havia chances para mim, que eu não era um caso perdido e que eu não estava sozinha. Estou feliz, mesmo que me sentindo muito perdida ainda. Estou esperançosa, creio que terei um período bom a frente.

Lembro de um dia em que entrei em crise dentro da casa dos artistas, em que eu chorava e perguntava para a enfermeira se eles iam conseguir consertar minha cabeça. Eu precisava saber se eles iam consertar minha cabeça, eu precisava. Ela disse que sim, que iam sim, enquanto me abraçava e tentava me consolar. Fiquei feliz de ouvir aquilo, mesmo pensando que era mentira. E eu realmente acreditei que era mentira, eu tive alta da clínica ainda acreditando que eles não iam conseguir me consertar. É engraçado. Eu me sinto consertada agora, não para sempre, mas por um tempo que creio ser suficientemente longo. É, me sinto controlada. Pelo menos por enquanto. Estou feliz. Estou um pouco assustada porque há muito, muito, muito tempo eu não me sentia bem assim sem motivo nenhum. Mas estou feliz. Creio que logo terei forças para enfrentar o mundo de novo, quem sabe voltar a estudar sem precisar trancar metade das matérias, quem sabe aulas de inglês ou francês, quem sabe.