"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Não me encaixo - A raiva e a inveja



Essas festas em família. Devo admitir que quase sempre as odeio. Eu tento, juro que tento, sentir que eu faço parte de tudo isso, que eu sou um de vocês e toda essa baboseira. Mas eu não sou. Simplesmente não sou. Todos os segundos que eu passar com esse família, vai ser mentindo, me escondendo nos cantos das salas barulhentas, invisível. É o que eu sempre faço desde que me entendo por gente. E ninguém nem liga. Ninguém vem em minha direção e tenta conhecer a Sabrina de verdade, ninguém. Talvez esse seja um papel meu, andar na direção de alguém e me mostrar. Assim do nada, sei lá. Foda-se, estou desanimada para essas coisas. Que eles pensem o que quiserem de mim. Que eu sou louca, problemática, etc, etc etc. Não me importo. Só queria desaparecer.

Posso ouvir minha mãe tocando piano para minha avó na sala, junto com meu irmão, tocando fagote. Ela está fazendo um papel que é meu, tocar piano junto com meu irmão idiota, eu deveria fazer isso. Mas como sempre, eu não posso. Eu não consigo. Minhas mãos tremem de ansiedade e medo só de pensar em tocar com alguém ouvindo, principalmente se esse alguém for a minha avó. E meu irmão toca com a facilidade com a qual minha mãe nasceu para a música. Todo mundo se orgulha do meu irmão... Ele é a pessoa mais idiota do mundo e todo mundo o elogia como se ele fosse perfeito. Não preciso nem dizer o quanto isso me deixa maluca. Ninguém liga para o que eu faço. Na época do vestibular eu passei para a segunda fase da fuvest mesmo estando absurdamente mal emocionalmente e ninguém se surpreendeu, meu irmão tirou míseros 35 pontos, como se fosse uma mula, e ele nem levou bronca. Eu completei uma iniciação científica, consegui bolsa por um ano na minha faculdade e recebi trocentos elogios de diversos mestres e professores... E minha família nem sabe praticamente.

Tudo sempre gira em volta da maldita igreja. Eu não vou na igreja, meu irmão vai. Está ai a grande diferença. A partir do momento que eu deixo de fazer parte dessa comunidade, eu estou automaticamente excluída da família, sou uma vergonha, uma decepção e sabe-se lá mais o que. Quero que se exploda essa igreja. Meu irmão é um hipócrita como 90% das pessoas que frequentam esse lugar (os outros 10% são burros de mais para entender o que significa hipocrisia então eles não contam). E eu não acho que isso seja motivo para orgulho. Ele pode tocar todos os instrumentos do mundo, ele continua sento um molequinho mimado, egoísta, escroto, hipócrita, cruel e oportunista. Não importa o quão cego vocês sejam, a verdade está ai e uma hora ela vai se mostrar. Uma hora meu irmão vai se foder como nunca na vida. E, bem, eu vou ter avisado.

domingo, 30 de dezembro de 2012

O border e a autoimagem



Estou lendo um livro sobre meu transtorno, pensei que seria bom, me conhecer melhor e aprender a lidar melhor com minhas dificuldades. Mas parece que não. A cada página que eu leio, mais desesperada eu fico. Eu pensei que já tivesse aprendido a conviver pacificamente com meu diagnóstico. Mas também parece que não. Eu simplesmente leio e leio e penso que não posso ser assim. Consigo enxergar como e onde eu me encaixo no diagnóstico mas quando leio as histórias de outros borders, eu simplesmente tenho vontade de me atirar de uma ponte. Eu não quero ser assim. Isso tudo é simplesmente horrível de mais, escuro de mais, sem esperança, sem nada remotamente positivo. E eu não quero ser assim. E se eu não puder evitar, eu não quero que ninguém saiba que eu sou assim. Eu não quero meus defeitos exagerados expostos por aí, por essas malditas cicatrizes em meus braços, pelo meu comportamento ou o que quer que seja. Sinto vontade de sumir, de desaparecer. Quero bater minha cabeça na parede até rachá-la no meio por ter contado para as pessoas a minha volta quem eu sou assim tão facilmente. Imagina se alguém lê esse livro ou um site qualquer que fale sobre o transtorno, não é preciso muito cérebro para entender que é melhor ficar o mais longe possível desse tipo de pessoa, de mim.

Eu odeio esse tipo de pessoa. E nem chega a ser irônico porque eu me odeio abertamente há um bom tempo. Tenho medo de olhar no espelho porque geralmente só isso é o suficiente para me fazer chorar por horas e começar a querer me machucar o bastante até que nada mais importe. Odeio espelhos. E no entanto não consigo parar de olhar meus reflexos, sentindo as ondas de raiva me tomando, me perguntando o que, droga, há de tão errado comigo, quem sou eu, porque não me sinto, onde estou... E há meu monstro. Um professor meu uma vez me disse que todos nós possuímos monstros dentro de nós. Acho que ele não entendeu o que eu quis dizer. Quando eu digo que há um monstro dentro de mim, não é uma metáfora, algo que tenha um significado profundo ou sei lá o que. Realmente existe um monstro dentro de mim, entendem? Posso sentir sua respiração, seus movimentos, quando ele se liberta das amarras que eu crio para contê-lo, posso sentí-lo tomando conta do meu corpo e me obrigando a fazer coisas que eu não quero, a sentir coisas que eu não entendo. Minha psicóloga não gosta que eu fale de meu monstro, nem meu médico eu acho. Acho que eles me acham meio psicótica ou fantasiosa. Mas o que eu posso fazer? Eu posso até não falar, mas sentir eu sinto. Meu monstro faz parte de mim. E talvez seja por isso que eu me odeie tanto.

Não gosto das coisas que ele pensa, sente e faz. Minha psicóloga diz que tudo isso que ele pensa, sente, faz, sou eu pensando, sentindo e fazendo. Pensando racionalmente eu entendo o que ela quer dizer, mas não é isso que eu sinto. Alias há sempre uma guerra dentro de mim entre a razão e a emoção. E a emoção geralmente ganha. De qualquer jeito... Eu não consigo aceitar quem eu sou. Assim como quando eu leio as histórias dos outros borders e eu sinto repulsa pelos mesmos. Quando eu leio histórias de pessoas com qualquer outro problema eu sinto compaixão... Mas com os borders não. Por que eu não tenho compaixão para comigo mesma, logo, não consigo ter para com aqueles que lembram a mim de mim mesma. Não sei... Mas talvez eu devesse parar de julgá-los tão duramente. Mas é difícil... Se você lesse acho que você entenderia o que eu quero dizer. Não somos exatamente flor que se cheire.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Tontura e sensações



Me sinto tonta, de novo. Do nada, sem explicação, como meus sentimentos e sensações sempre parecem aos meus olhos. Não sei ao certo se as coisas não possuem razão ou se sou eu que não consigo identificá-la. De qualquer jeito me sinto estranha. Fecho os olhos, ralho comigo mesma e os abro assustada, olho para minhas mãos involuntariamente, ralho comido mesma de novo e as mantenho fora do meu campo visual, olho para o copo de suco na minha frente. Vidro. Posso sentir minha alma, ou seja lá como se chama essa coisa, minha personalidade, tudo o que eu sou ou reconheço como sendo meu, saindo de meu corpo. Vidro. Minha cabeça gira. Me sinto Alice quando ela cai na toca do coelho, rumo ao pais das maravilhas. Caindo, caindo, caindo. No meu caso caindo para cima, voando sobre minha cabeça, me abandonando. É de vidro o copo. Está aí algo importante. Permito que minhas mãos voltem para meu campo de visão para que eu possa segurar o copo, não ligo muito para o fato dessas mãos não parecerem minhas e que pouco a pouco o que elas fazem parece se tornar cada vez mais desconectado. É bonito esse copo de vidro. Me lembro do caco de vidro que eu mantinha escondida na minha gaveta, só para o caso de uma emergência. A gente nunca sabe quando vai precisar de um não é mesmo? Costumava me manter segura, esse pedaço de vidro. Mas um dia em que eu estava mais forte minha psicóloga conseguiu me convencer a jogá-lo fora.

Às vezes ainda me arrependo. Não tanto pela auto-mutilação, mas só pela sensação de segurança que ter algo cortante me proporcionava. Isso soa estranho? De qualquer jeito fiquei olhando o copo, ainda me sentindo estranha, com minha cabeça rodando, e com a imagem do maldito copo se movendo de forma familiar, como se eu estivesse embaixo d'água ou coisa assim. Eu conheço tudo isso muito bem. Eu poderia quebrar o copo, poderia me agachar e fazer o que eu tanto tenho vontade, o que eu tanto luto todos os dias para não voltar a fazer, poderia. Seria fácil. Não tinha ninguém ali. Virei o resto de suco que tinha no copo, mesmo não querendo tomá-lo, e me sentindo mais esquisita do que nunca o coloquei de volta na mesa e sai correndo para meu quarto, para sentar aqui e escrever. Por que, apesar de tudo, mesmo eu tendo diminuído e muito a frequência de meus textos, ainda acredito que eles são a janela para que eu não enlouqueça. Me sinto um pouco mais viva enquanto meus dedos digitam qualquer coisa aqui, me sinto um pouco mais presente. É verdade que quase nada se iguala a sensação de ter uma lâmina na minha pele e não me importo se isso soa masoquista, só estou sento sincera. Não se pode fazer trocas, eu já tentei trocar muitas coisas pela automutilação mas essas trocas nunca duraram muito tempo. Acredito que é preciso aceitar primeiro que isso é sim uma parte muito importante de você, mesmo que seja muito ruim, e que nada vai substituir isso. Por que você pode passar a vida procurando sentir a mesma coisa fazendo outras coisas, mas isso sempre irá te levar para caminhos ruins, como drogas, álcool e sexo totalmente não seguro. É um vício, não se troca um vício pelo outro, isso não é construtivo.

Um vício precisa ser combatido ele por ele mesmo. Um viciado sempre vai sentir vontade de voltar a fazer ou usar seu vício, isso é fato, não adianta negar. Eu ainda tenho vontade de me cortar, como hoje, mas é só uma vontade e eu a combati e ganhei, deixando o copo exatamente onde ele estava e ignorando minhas sensações estranhas. Enquanto eu puder fazer isso, está tudo bem. Faz parte de mim, mas eu estou sob controle, mesmo que às vezes não pareça muito. Mas eu realmente acho que agora, ao menos agora, eu estou sob controle e é isso que mais importa.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Desajeitada socialmente falando



Te convidam para sair e você tem vergonha que alguém perceba alguma coisa. Faz calor e você tem vergonha de tirar a blusa. Te oferecem bebida e você tem vergonha de dizer que não pode. Suas mãos tremem e parece que sempre de forma pior quando alguém está olhando para elas. Você só queria parar, porque tudo isso faz você parecer nervosa e esquisita, e você nem está tão nervosa assim e você não quer parecer tão esquisita assim. Mas nada obedece e isso é tão irritante. Às vezes eu só queria sumir, mas não dá. Às vezes eu queria não ter vergonha de mim mesma, e me orgulhar de mim mesma, as pessoas às vezes me falam para eu me orgulhar.... Mas eu não consigo. Acho que é um pouco difícil de mais, não sei. Eu não quero ser diferente, acho que ai está a angustia toda, eu quero fazer parte, quero me sentir parte de algo. Então eu odeio a mim mesma quando sento em uma roda e simplesmente não consigo falar absolutamente nada, todo mundo fala, não deveria ser tão difícil. É, é muito difícil. Meu me odeio por não poder beber e me odeio quando bebo porque não posso. Odeio minhas cicatrizes em meus braços e odeio quando minhas mãos tremem por causa dos remédios. Odeio ser tímida e desajeitada. Odeio como me sinto feia e inferior às pessoas que estão comigo. Odeio como eu invejo a vida de qualquer um. E odeio como tudo isso contribui para eu me tornar muito distante e aérea.

Tudo isso é muito ridículo, e eu não consigo fazer diferente. Eu queria só não ligar para nada e simplesmente me divertir. Ser eu mesma! É o que todo mundo fala, como se fosse algo fácil ou óbvio. Não é. Primeiro porque eu não faço ideia de quem eu sou, não mesmo, é difícil separar meu transtorno da minha personalidade. Até porque é um transtorno da personalidade, o que eu tenho, ou seja, minha personalidade é "doente", por assim dizer. Eu nunca sei direito se existe a "personalidade normal" da Sabrina e a "personalidade Borderline" ou se só existe a minha personalidade que é Borderline. Entende? De qualquer jeito eu preciso me observar constantemente, para conseguir identificar quando a parte doente de mim mesma começa a agir e para pará-la antes que ela faça mais um estrago muito grande. Então, ao me "vigiar" eu de certa forma estou me proibindo de ser eu mesma. Porque, ser eu mesma, significa dar liberdade para todas as faces da minha personalidade, inclusive a considerada "doente". Essa vigilância toda me deixa muito nervosa e incomodada. Tenho um medo absurdo de escorregar, como vira e mexe eu faço, e decepcionar as pessoas a minha volta.

E eu acho que esse é um dos grande motivos que eu sou tão desajeitada socialmente falando. Eu não posso ser eu mesma, então eu quase nunca estou confortável, o que faz com que eu entre em um ciclo vicioso de comportamentos que eu odeio. Às vezes eu penso se não seria melhor eu jogar todo meu tratamento pro teto e viver livre, leve e solta. Mas ai eu olho para meus braços e me lembro que a pseudo-liberdade pode custar muito caro.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Somos infinitos



Eu sei que nem sempre é verdade, mas na maioria dos casos a gente se arrepende mais do que a gente nunca fez do que o que a gente já fez. Quero dizer, é mais triste olhar para trás e não ver coisa alguma do que olhar para trás e ver um monte de merda. Quando eu olho para trás, vejo que todos os erros que na época tanto me fizeram sofrer, hoje quase não possuem importância nenhuma e estão ali, em seus cantinhos, como mais uma experiência e algo que muito provavelmente eu não vou fazer de novo, mas que foi bom eu ter feito. Mas foram poucos erros. Eu sou naturalmente cuidadosa, mas quando meu monstro vem a tona, me torno uma impulsiva autodestrutiva. Tanto a Sabrina quanto o Monstro já cometeram erros, e por mais que na época eu quisesse me matar por cada um deles, hoje eu não ligo. Para ser bem sincera queria ter perdido o controle da situação mais vezes, mas isso é um segredo, cá entre nós. Queria ter bebido mais enquanto podia, queria ter experimentado mais drogas, queria ter dançado mais vezes, queria ter ido a mais shows (esse ano eu fui em meu primeiro show, com 20 anos nas costas). Eu queria ter conversas regadas a vinho, discussões, sexo! Queria ter sido mais feliz.

O grande problema é que na maior parte de toda a minha vida eu estava ocupada de mais me sentindo desconfortável para me divertir e ser feliz. Eu pintava minhas mentiras cuidadosamente, diariamente, para enganar a mim mesma e caso alguém ou alguma coisa tentasse me tirar desse meu transe, eu rapidamente me tornava agressiva e arisca, me fechava mais ainda, serrando meus pulsos com minha raiva sempre um pouco desproporcional de mais. Eu não tinha muito tempo para cometer os "erros" que todo mundo cometia. Eu não tive muito tempo para ser criança ou adolescente e nas pequenas escorregadas que eu dava eu me arrependia tanto e tão amargamente que não seria surpresa se hoje eu ainda estivesse no mesmo transe que eu estava quando era pequena. Mas ninguém é perfeito. E por mais que eu quisesse ser, graças a deus, eu nunca cheguei nem um pouquinho perto disso. E aos poucos toda a imagem que eu pintava sobre a minha história, sobre a minha vida, foi se rachando e quebrando e por fim, a realidade veio a tona.

Hoje a principal coisa da qual eu me arrependo é a de ter gasto tanto tempo mentindo para mim mesma, desperdiçando os anos que deveriam ser leves, agradáveis e felizes. Tenho poucas lembranças felizes. Eu correria o risco de me perder para ter mais desses lembranças. Afinal como a vida pode valer a pena sem elas? Que histórias eu vou contar para meus filhos? Do que eu e meus amigos vamos rir quando ficarmos mais velhos? Eu invejo muito pessoas que já fizeram um monte de besteiras na vida. Minha vida foi sempre tão regrada e eu quase nunca tive a coragem para quebrar essas regras. Mas estou tentando. Estou tentando participar. Como Charlie, daquele livro do Stephen Chbosky.

sábado, 22 de dezembro de 2012

De novo e de novo e de novo... - Sobre a compulsão à repetição



Outro conceito interessante de Freud, que eu li no meu mais novo livrinho muito interessante, é a compulsão à repetição, ou seja, a tendência da mente de reviver situações desagradáveis ou traumáticas. Me perdoem se eu entendi errado, mas parece que a mente se utiliza desse mecanismo para gerar angustia e, assim, se proteger. A angustia nos prepara para o perigo, dessa forma, ao gerar angustia a mente estaria nos preparando para caso a situação traumática aconteça novamente. O que causa a neurose traumática é o susto, dessa forma a memória dolorosa é revivida frequentemente, gerando angustia, até que uma defesa eficiente tenha sido construída em nossa mente após o evento. É por isso, e finalmente tudo isso faz sentido, que quando algo ruim acontece, aquilo demora tanto para sair de nossas mentes, ou até mesmo nunca chega a sair, quer essa vivência esteja sendo revivida exatamente como aconteceu, quer ela esteja aparecendo de forma disfarçada ou mascarada.

É um exercício cansativo. É comum, por exemplo, que a pessoa traumatizada tenha pesadelos diariamente sobre o que quer que tenha acontecido. Inicialmente esse mecanismo repetitivo parece inútil, como uma enorme roda gigante de auto-tortura. Noite após noite acordando assustado, suando frio, medos irracionais, nevosismo e inquietação excessivos ao se ouvir um determinado som, ou sentir um determinado cheiro ou ver algo, ou pensar que se viu algo. A vida se torna pesada, muito pesada. Você passa a viver sempre na defensiva, como se a qualquer momento aquilo pudesse acontecer novamente, e realmente pode. Na verdade já está acontecendo, todo o santo dia, dentro da sua mente. E o fato de não ser "real" não quer dizer que o sofrimento seja menor. Mas por mais que tudo isso pareça inútil, existe uma razão para você não conseguir esquecer.

Não é para você esquecer. Sua mente precisa aprender a se preparar e a lidar com o que lhe aconteceu, dessa forma ela estará enfim protegida. Imagino que isso signifique "superação"? Talvez. Se pensarmos que superação signifique passar de uma situação ruim para uma boa, evoluir, se recuperar... Faz sentido. Quando sua mente aprende a lidar com o fato traumático, sua lembrança se torna só isso, mais um lembrança. Ela nunca vai ser uma boa lembrança, óbvio, mas pouco a pouco vai deixar de se tornar uma tortura, um peso, uma ferida aberta. E as noites em que você vai acordar suando frio, em meio a um grito mudo, vão se tornar cada vez mais raras... E um dia, quem sabe, você vai poder inclusive falar sobre isso com outras pessoas sem acabar em um mar de lágrimas e desespero. Isso é crescer. Evoluir, se superar.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Freud e as lembranças afogadas



As piores lembranças são aquelas que não conseguimos ter acesso. Isso me veio em mente enquanto lia o livro sobre Freud que eu ganhei hoje de um professor muito querido meu. Fico repetindo a frase para mim mesma, como se uma luz tivesse se acendido em minha mente e, por mais que eu tenha notado algo de diferente, ainda não sei dizer o que, como nem onde. Tenho medo da minha mente e não sei até onde isso é considerado normal. Nunca perguntei para alguém, como quem não quer nada, você tem medo da sua mente? Isso seria entranho. De qualquer jeito, tenho medo. Imagino meu cérebro como um lugar em caus completo, cheio de rachaduras, sujeiras, labirintos e becos. E há as lembranças, espalhadas para todo o lado, algumas mais desgastadas outras ainda novas. Entre essas lembranças há aquelas que eu não gosto de olhar ou entrar em contato de jeito nenhum, mas o que mais me assusta não é a existência dessas lembranças e sim há existência das lembranças que, justamente, eu não consigo acessar. Como se existisse um inferno secreto, mais fundo do que meu inferno atual, no qual coisas piores e mais assustadoras existem.

Você nunca teve essa sensação? Ao tentar se lembrar de algo, de que algum pedaço do que quer que você esteja tentando se lembrar é simplesmente impossível de ser recuperado? Como se alguém tivesse queimado um período de lembranças da sua mente ou como se existisse uma barreira entre você e elas, uma barreira intransponível. Eu tenho muito essa sensação. Me pergunto o que poderia ser, guardado tão bem guardado desse jeito. É difícil até chegar perto disso, é como se queimasse, destruindo qualquer coisa a sua volta, eu simplesmente não consigo. Lembro da época em que estive internada e o psicólogo da clínica tentava arrancar algo de mim. Doía muito, eu chorava muito... Mas não cheguei nem um pouco perto de descobrir o que eu guardo tão profundamente dentro de mim. E ele sabia, de alguma forma que eu não consigo entender, que eu guardava muitas coisas e que eu precisava vomitá-las antes que elas me destruíssem. De qualquer jeito, eu não fiz muitos avanços na clínica a esse respeito.

Mas talvez não seja coisa alguma. Talvez as pessoas precisem fingir que guardam algo, bem lá no fundo, por que admitir sua superficialidade seja algo chato e fora de moda de mais. E se assim for eu posso respirar aliviada, já que essa é uma tremenda prova de que eu sou igual e normal. Mas talvez não, talvez Freud tenha razão e bem lá no fundo, passando todas as barreiras, há algo mal resolvido que pode explicar e resolver todos os meus problemas atuais. Se realmente fosse possível atenuar meus sintomas só recuperando esse espaço perdido em minha mente, eu colocaria a mão no fogo.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Uma luta que já nasceu morta



Alguém precisa tirar esse espinho de mim. Meu coração sangra e é difícil até chorar. Estou um pouco cansada, não sei ao certo de que. Há todos esses sentimentos explodindo dentro de mim e eu não sei como expressá-los, não sei como deveria deixá-los sair. Antes havia saídas, autodestrutivas, é verdade, mas ainda assim, saídas, válvulas de escape, agora não resta nada. Minha cabeça e meu peito doem constantemente, e nem escrever direito estou conseguindo. São os remédios? Estou sempre culpando os remédios, olho sempre com desconfiança para eles... Quando minhas mãos tremem e escrever se torna um trabalho ridiculamente árduo, quando meu raciocínio se torna ridiculamente lerdo, quando meus olhos enxergam o mundo em câmera lenta, quando o que não se mexe passa a se mexer, ou quando minha visão se torna turva, ou quando meus pensamentos se tornam repetitivos, quando fico paranoica e tenho medo de abrir os olhos, ou abrir uma porta, ou dar um passo a frente, etc, etc e etc.

Sempre acho que eles estão agindo de mais, ou agindo de menos. Nunca na medida certa. Na medida que eu acredito que poderia me tornar uma pessoa normal. Ai você pode me dizer, como já ouvi milhões de vezes, que ninguém é normal e toda essa historinha que a gente conta para as crianças de que cada pessoa no planeta é única e especial e não sei mais o que. Não. Não estou dizendo normal nesse sentido, estou dizendo normal no sentido: "Não tenho nenhuma doença que de alguma forma dificulta de forma significativa a sua vida". É... Eu gostaria muito de não ter esse monstro dentro de mim, e toda essa dor, e raiva, e confusão. Tenho sérios problemas em superar coisas ou dificuldades, em dar a volta por cima e em esquecer e perdoar. Me considero uma pessoa atrasada e difícil. Não gostaria de ser assim... Gostaria de ser leve e livre como algumas pessoas o são (e como eu as invejo). Aquelas pessoa comunicativas e simpáticas, inteligentes e engraçadas e já chega por ai porque perfeição de mais também irrita.

Mas as coisas nunca são fáceis, pelo menos as que realmente importam. Não consigo ser essa pessoa legal, comunicativa e cheia de amigos. Talvez seja porque eu não sou assim. Mas na verdade eu não sei como realmente sou. Já que minhas emoções extremas podem me tornar pessoas opostas e incoerentes entre si... Mas ai vem os remédios, que me prendem no limbo que é o meio de tudo isso, nem uma coisa nem outra, o nada, o vazio. Eu não consigo me enxergar como uma pessoa normal, como eu deveria me sentir quando todos esses remédios e terapias conseguem me controlar... Eu me sinto como uma pessoa anulada. Me sinto como um animal selvagem preso em uma minúscula jaula de um zoológico qualquer. Eu, o que eu sou, sou obrigada a admitir, na mais pura essência, é aquela tão conhecida bagunça, aquela dor e raiva desmedidas, o sangue escorrendo pelos meus braços, um coração pulsante e descompassado, pupilas dilatas, punhos cerrados e, enfim, choro, fraqueza, dependência, infantilidade. A minha personalidade, tudo o que eu sou, está em um livro de doenças, mas sabe... Não importa, importa? Essa sou eu. Esses são os meus defeitos. E essa luta, se você olhar bem, já nasceu morta.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Machismo, racismo e homofobia nossa de cada dia



Teve aquele que apanhou. Na Paulista de novo? E nos Estados Unidos o que foi torturado pelos pais e pela igreja. O bullying continua, e os suicídios... Tem lugar no mundo que quer voltar a tratar o assunto como crime de pena de morte... E em casa eu ainda sou obrigada a olhar para a cara de uma Veja todo santo dia. Ah... A antiga classe média, branca e conservadora brasileira. Todos pensam tão iguais, tão superficialmente iguais, tão pateticamente iguais. Tenho vontade de sacudir-lhes a cabeça, tirar as teias de aranhas desses pensamentos há tanto tempo enraizados e intocados. E mesmo a juventude! Tão velha das ideias que chega a ser assustador. Me pergunto se há esperança, me pergunto se é possível abrir os olhos de quem nunca soube o que fazer com eles. Talvez não. A raiva bate em meu peito, vontade de gritar, vontade de sair correndo, como não enxergam? Como não crescem, não se mexem, não raciocinam, não coisa alguma. Já estão mortos, há muito tempo, talvez antes mesmo de nascerem. E eu gastando minha energia com o que já foi perdido... Deveria só ignorar e seguir em frente, me importar com quem ainda vale a pena.

Mas sou teimosa de nascença, assim como eles, só que minha teimosia tomou outra direção. Quero ressuscitá-los, quero arrancar-lhes os olhos, sujar-lhes as mãos e os pés... Maldito lugar comum, quero explodir com isso, quero que eles vivam uma vez na vida e enxerguem o quão horrível e maravilhoso o mundo de fato é. Me entristece essa característica presente nesse tipo de pessoa, quase robozinhos repetindo sempre as mesmas frases, as mesmas falácias, a mesma burrice generalizada. Tenho a sensação de que nunca nasceram e, dessa forma, nunca poderão crescer e enfim formar sua própria opinião. Mas também, quem sou eu? Ainda gaguejo em meus pobres argumentos, ainda me vejo dominada por toda essa raiva que só cala, que só torna o mais racional dos argumentos, sem sentido. Invejo a calma dos adultos, o meu erro é ainda ser criança de mais, emocionalmente falando, principalmente emocionalmente falando.

Gosto das discussões, quando o vulcão de emoções dentro de mim está apagado, quando minha mente é clara e rápida. E não é todo o dia que eu tenho essa sorte. Outro dia perdi uma discussão que virou briga e a minha burrice permitiu que meu irmão continuasse se afundando em seus preconceitos e ingenuidades... Tão novo... E nem um pingo da boa e velha inquietude e não aceitação dos jovens para com sua realidade e mundo. Tão jovem e com ideias tão velhas quanto as ditadas pela minha avó inocentemente racista e machista.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Medos e receios



O medo. Fecho os olhos e não posso abri-los novamente, não posso, não posso. Há um monstro bem diante de mim, posso senti-lo, posso ouvi-lo, se eu abrir os olhos ele vai me pegar, ele vai existir de verdade, enfim, e nunca mais vai embora. Meus braços tremem, quero colocar minhas mãos diante de meus olhos, para me proteger, para poder abri-los e continuar não vendo nada, mas não posso, não posso. Se eu me mexer o monstro vai me pegar, ele está só esperando, só esperando... Por que não vai embora? Imagens horríveis passam diante de meus olhos fechados, vai acontecer comigo, vai acontecer, vai acontecer. Quero pensar em outra coisa, quero dominar minha mente, meu corpo, quem eu sou, mas não posso, não posso. Estou tão assustada que nem chorar eu consigo, o medo me paralisa, o monstro me paralisa. É a primeira vez que eu o sinto fora de mim de um jeito tão forte, não sei o que é pior, ele dentro de mim me expulsando de mim mesma ou fora... me cercando, acuando, aterrorizando.

Não sei o que fazer, não sei o que fazer. Quero gritar por ajuda, quero que alguém me abrace e me tire daquela situação. Mas não posso me mexer, não posso, não posso. Não posso falar, não posso abrir os olhos, logo não poderei mais respirar. É como estar se afogando, sentindo as esperanças te abandonando a medida que você afunda na escuridão. Eu deveria estar escrevendo sobre os medos e anseios que tenho do período que está por vir, quando estarei longe da minha psicóloga e da minha namorada... Mas no fim estou só escrevendo sobre um medo totalmente irracional e irreal. Mas talvez todos os medos sejam irracionais e irreais, não sei ao certo. O que posso dizer? Tenho medo do meu monstro, tenho medo de mim mesma, tenho medo de fechar os olhos, tenho medo de abrir portas e de olhar para os cantos escuros de algum lugar, tenho medo de banheiros, tenho medo do meu gato andando sorrateiro pela casa, tenho medo de ficar sozinha, tenho medo de ser abandonada ou deixada de lado, e tantos outros.

E para cada medo, há a tendência de se criar um comportamento obsessivo, e para cada comportamento obsessivo, uma fuga, que alimenta outras fugas, e geram outros comportamentos e assim por diante. É preciso lutar. Sempre é preciso lutar. Eu preciso me manter forte, independente das coisas que aconteçam a minha volta... Meu mal é ser altamente influenciável pelo ambiente a minha volta. O que posso fazer? Não posso abrir os olhos enquanto o monstro estiver bem diante de mim, pronto para me atacar ao menor sinal de fraqueza.