"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

sábado, 8 de outubro de 2011

A personalidade limítrofe


É algo como não saber ao certo o que é certo e errado. Não, é pior, é não fazer nem idéia do que é certo e errado. É algo como não existir, é como amar o outro como a si mesmo (o pior erro que alguém já disse se tratar de virtude), é odiar a si mesmo como se você não fosse. É algo como andar perdido em uma floresta de espinhos, onde cada movimento resulta em um corte, onde cada corte resulta em milhões de perdas e você não sabe se permanece parado e morre ali mesmo de inanição ou corre em busca de uma saída e se mata lutando. É algo como escolher algo que não está entre as opições, é interpretar o não-interpretável e não entender nem um pouco o óbvio. É como ser extremamente inteligente e lamentavelmente burro. É como nunca pensar em coisa alguma, desenvolvendo raciocínios complexos para isso.

É como ser órfão de pais vivos no quarto do lado, é como estar sozinho cercado de amigos, é como ser surdo e querer cantar, é como correr no meio da rua de olhos fechados, é como se recursar a comer por ser magro de mais. É algo como entender o raciocínio lógico mais complexo e não compreender que entre dois polos existe o equilíbrio, o meio, nem mais nem menos. É algo como explicar as cores para um cego ou os sons para um surdo, é complicado, senão impossível. É como ser todas as vítimas do mundo em uma pessoa só, e todos os carrascos também. É o amor personificado de forma hedionda, é o ódio personificado de forma carinhosa. É e não é, tudo e nada, sim e não, oito ou oitenta, quente ou frio. Nada de morno, mais ou menos, ou tudo o que pareça remotamente com o equilíbrio. É como ter um furacão no lugar de um cérebro. É sentir de mais sem saber o que isso significa.

É como ser acusado de tudo o que os outros chamam de qualidades nas pessoas normais. É como morrer de amor ou matar de amor, não faz sentido, não é se sabe dizer se é lindo ou horrível. É conquistar mil amigos, odiar todos eles e não suportar ficar longe de nenhum. É como confundir um soco com um abraço, um carinho com uma facada, um beijo com uma mordida e vice versa. É algo como ter todos os sentimentos do mundo concentrados e guardados em potes dentro de si, quebrar todos eles e deixar escorrer descontroladamente. É como chorar quando se deve rir e rir quando se deve chorar. É um buraco negro de estimação. É ser uma criança atrasada, um adulto escondido, um velho adiantado.

É algo como esquecer que um curativo é um curativo e não uma faca, é algo como não saber o que é dor e senti-la todos os dias, todos os minutos, todos os segundos. É algo como morrer. É algo como viver como ninguém. É algo como querer morrer, chamando pela vida. É algo como querer viver, implorando a morte. É como não saber pensar, não saber sentir, não saber mover se quer seu próprio braço. É como saber fazer tudo isso tão perfeitamente a ponto de enganar o próprio cérebro. É algo como compreender a realidade no meio de uma alucinação. É algo como não entender nada da realidade em um dia totalmente comum. É dizer a verdade mentindo. É falar de mais sem dizer nada, é falar nada, dizendo tudo.

Viver com um limítrofe é questão de convivência, de preservação, de capacidade de separar o caos da racionalidade, é questão de paciência e habilidade. E sorte.

Obrigada a todos que continuaram ao meu lado apesar de tudo.

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