"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Não essa noite.



Eu não costumo postar outros textos se não os redigidos por mim mesma. Porém esse texto, escrito para mim, por minha amiga Lilian Eloy, é tão sensível e tão condizente com minha realidade que simplesmente não pode passar em branco. Espero que gostem tanto quanto eu:

Perspectiva


Morte. É assim que, geralmente, tudo termina. Mas não hoje.
Hoje, tudo começa pela morte.
Bem, não exatamente a morte, mas a quase-morte. Minha quase-morte.

Nunca fui uma dessas pessoas que facilmente fazem amigos, que tem um prazer enorme em falar tudo que há para ser dito sobre ela mesma.
Sou uma pessoa “difícil”.

Engraçado como foi fácil conseguir comprar Novocaína na farmácia. Apenas tive que simular uma dor de dente, a atendente nem desconfiou.

O ruim de ser uma pessoa difícil é que, por mais que eu me esforce, por mais que eu saiba que é bom para mim, por mais que o mundo grite “Não é bom estar sozinho!”, eu não consigo deixar as pessoas se aproximarem de mim.
Não é algo seletivo, não é como se eu acordasse esporadicamente e resolvesse ignorar todos a minha volta, não. Eu apenas não consigo.
Talvez seja medo, medo de decepcionar alguém, medo de dar a falsa impressão de que eu sou amigável.
Já tentei ser, até consegui por alguns momentos, momentos que não duraram muito.

O ruim de tentar se matar é que você quase sempre se arrepende pouco antes de ser tarde. E se arrepender de tentar se matar depois de quase conseguir é uma dureza, meus não-amigos.
Já passei por essa situação algumas (muitas) vezes. A adrenalina, a certeza de estar fazendo algo para seu bem, para o bem daqueles a sua volta, aaah, eu seria uma heroína, tinha certeza disso.

A Novocaína já estava fazendo efeito, eu não queria sentir, não queria sentir meu heroísmo. Eu sabia que ele iria me machucar. Já havia machucado tanto antes...

As vozes daquelas pessoas ecoavam na minha mente. Todos aqueles rostos cheios de piedade. Aquilo só aumentava a dor. Ter dó, ter pena, é uma facada que eu deixo de dar em mim mesma, mas dói do mesmo jeito.
Eu queria muito acreditar nelas, aquelas pessoas gentis, amáveis.

“Talvez se eu me desse mais uma chance....”, pensei com meus botões... “Não seja estúpida! Vai ser a mesma coisa, quem você quer enganar?”, é tão fácil sermos persuadidos por nós mesmos.

Eu podia sentir meu coração acelerar. A expectativa... Ia tudo terminar, ia ficar tudo bem, eu já não me sentiria como uma inútil. Sorri diante dessa perspectiva.

É tão fácil, tão fácil atravessar a barreira entre a vida e a morte. Apenas um pulso firme e um pouco mais de pressão. A precisão não era importante, o estrago seria grande.

De repente, ouço um miado.
Meu gato arranhava a porta do quarto. Queria entrar para, como de costume, dormir comigo.

Saí daquela minha perspectiva e comecei a chorar.
Minhas lágrimas escorriam pelo meu rosto e molhavam o chão.... Meu gato miava mais alto.
Seria possível? Será que ele sabia das minhas intenções?
Aquele pequeno ser, há tão pouco em minha vida, já sabia mais que muitas outras pessoas.
Eu não deveria me culpar, mas a culpa era minha, eu me afastei de todos e me entreguei à melancolia. E ela me acolheu tão bem...

Eu começava a questionar minha lógica, meu ladro negro que sempre dizia que tudo iria passar se eu não estivesse mais entre os vivos.

Eu tenho 19 anos, estou confusa. Não sei mais pelo que lutar.
A verdade é que é muito difícil lutar pela nossa própria vida quando a luta é contra nós mesmos.
É difícil achar motivos pelos quais lutar quando eu mesma não me permito acreditar que esses motivos existem.

O que eu posso fazer? Como eu posso fazer? Como matar algo que sempre foi tão natural pra mim? Como fazer isso sem matar a mim mesma?

Eu vou me dar outra chance, todos merecem perceber que o mundo é mais que atos heróicos cometidos individualmente.
Meu sangue não vai redimir a podridão do mundo.
Não essa noite.

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