"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Tarde demais Deus.



Hoje lembrei de uma época em que me sentia tão sozinha e angustiada que todo dia rezava para Deus para que ele me enviasse algo para me fazer companhia. Eu pedia um passarinho que viesse cantar em minha janela todas as manhãs, para me dar forças para levantar da cama e enfrentar mais um dia, um passarinho que respondesse a melodia incerta que saia do meu piano, pelos meus dedos de criança. Um amigo. Deus, me envie um amigo. Um amigo que não me machuque, que simplesmente cantarolasse ao meu lado e levasse essa tristeza embora. Eu choro só de lembrar do meu desespero por uma resposta dos céus. Na igreja eles me diziam que meu único amigo era Jesus e que eu deveria me contentar com isso. Eu não me contentava com Jesus, ajoelhava por horas chorando de tanta culpa. Deus, me perdoe, me perdoe, eu prometo que nunca vou pedir mais nada se o senhor me enviar um passarinho para me fazer companhia. É só isso que eu peço. Deus, eu me sinto tão sozinha.

Lembro claramente do dia em que eu acordei e por acaso tinha um passarinho cantando na minha janela, lembro de chorar de alegria, de alívio, de esperança. Mas no dia seguinte ele não estava mais lá, foi quando eu percebi que tinha esquecido de acrescentar no meu pedido que eu queria esse passarinho todos os dias comigo, não só uma vez. Meus olhos se enxeram de lágrimas novamente. Não poderia consertar esse engano, já tinha prometido que não pediria mais nada. Foi tão difícil ficar grata por essa pequena resposta dos céus. Aos poucos foi parando de pedir ajuda para Deus. Aos poucos eu não pedia mais nada, só levantava a cabeça para o céu, sufocando em cada vez mais lágrimas e perguntado porquê. Por que Deus? Por que comigo? O que eu fiz para merecer isso? Onde está você? Por que foge? Por que, por que, por que... Na igreja eles me diziam para não confiar nas pessoas, para confiar somente em Deus. Eles me diziam que eu não precisava de ninguém, só de Deus, que eu deveria me contentar com isso, que eu deveria entregar minha vida inteira só para Ele. Eu não confiava em ninguém, eu não tinha ninguém, mas tampouco tinha Deus ao meu lado, tampouco me contentava com isso.

Então eu voltei a pedir uma única coisa para Deus. Insistentemente, todos os dias. Deus, me mate. Deus, por favor me mate. Me mate antes que eu mesma o faça. Pouco a pouco eu fui abandonando tudo o que era certo para mim desde pequena. Eu já não conseguia me sentar em meu piano e treinar os hinos para um dia quem sabe estar na orquestra da minha igreja. Não... Eu socava as teclas do mesmo com raiva, as lágrimas escorrendo do meu rosto. Eu nunca tocarei na igreja, eu nunca serei o orgulho da família, eu nunca sarei tão boa quanto minha mãe foi. Eu sou uma vergonha. Não consigo, não consigo, não consigo suportar toda essa dor. E enquanto eu castigava as teclas a minha frente eu ouvia um passarinho cantando na minha janela, o que me fazia chorar mais ainda. Tarde demais Deus, você chegou tarde demais. Eu não quero mais um amigo que cante para mim, eu quero que você me mate. Consegue entender? Cortei meu cabelo, se pudesse teria queimado todas as minhas saias, guardei minha Biblia e nunca mais cantei hinos baixinho para me acalmar, abandonei tudo o que me fazia lembrar o Deus que um dia eu pensei que poderia me salvar. Você me decepcionou Deus. Hoje falo que não acredito em nada disso, não sei se você existe ou não, mas eu te odeio. Odeio também as pessoas idiotas que acreditam em você, que acham que você pode oferecer algo a elas. Você não oferece nada, a vantagem de se acreditar em um Deus está nas próprias pessoas que se tornam ridiculamente positivas e por isso tem mais energia para passar por dificuldades. Mas quando essas pessoas encontrarem um problema de verdade, um problema que nem todo o positivismo do mundo pode resolver, então elas vão enxergar o tão sozinhas elas estão... E vão se sentir que nem eu. Tarde demais Deus.

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