"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

quarta-feira, 2 de maio de 2012

HELL



(Texto produzido por mim e apresentado na aula de Lingua Portuguesa, inspirado no livro Hell de Lolita Pille.)

"As pessoas se assustam, olham para meus braços destroçados e me julgam louca. Bem, eu sou louca, mas não é só isso. Não se julga um livro pela capa, é o que dizem, eu concordo, não me julguem só pelas minhas cicatrizes. Eu sou uma pessoa muito pior do que aparento, eu não sou só louca. Eu sou pior do que isso. Eu cresci acostumada a dor e a solidão. Ainda criança eu já dizia para mim mesma que não tinha família ou amigos verdadeiros, eu nunca me senti parte de coisa alguma, a não ser do meu inferno particular. Foi em meio a esse sentimento extremo de rejeição que eu cresci, cada vez mais depressiva, isolada e explosiva. A solidão, inicialmente, me fez uma criança muito independente e de certa forma assustadoramente madura. Eu não me lembro de depender de qualquer pessoa nessa época, eu não precisava de ninguém. Eu cresci rápido demais, eu fui obrigada a crescer rápido demais. Para ser sincera acho que nunca fui criança, pelo menos eu não me lembro de me sentir como uma. Aos 8 anos eu já aguentava sem chorar coisas que, hoje, com seus 20 e poucos anos, nenhum de vocês aguentariam. Eu não reclamava, eu não questionava, aquela era a única vida que eu conhecia.

Mas ninguém é de ferro, um dia tudo se quebra, a mente se quebra, a personalidade, tudo o que é real, tudo o que antes era certo para você. Eu quebrei. Em um momento aos 15 anos de idade eu finalmente quebrei. Algo se quebrou para sempre dentro de mim. Creio que tenha sido a gota d'água, e essa gota me fez enxergar tudo o que eu tinha vivido a infância inteira e o que eu estava vivendo naquele momento. Eu não aguentei o tranco. A verdade é sempre dura demais, destrutiva demais, fria demais... Mentir é muito mais fácil, muito mais suportável. Mas não havia mais lugar em minha mente para mentiras, eu já tinha passado a vida inteira escondida atrás delas. Então, pouco a pouco, eu fui caindo. Se você acha que alguma vez já chegou ao fim do poço é porque você ainda não me conheceu bem o bastante. Primeiro, de pessoa aparentemente independente e confiante (só aparentemente porque eu nunca fui verdadeiramente confiante e segura de si), eu passei para alguém altamente dependente, frágil e instável. A força que vinha me sustentando até então desapareceu e eu me sentia mais sozinha do que nunca. Meu humor foi se tornando cada vez mais instável, ao ponto de em poucos minutos eu passar da alegria intensa para a mais profunda depressão, e isso acontecia todos os dias. Me chamavam de bipolar na escola, era divertido para as pessoas a minha volta observarem o quanto eu estava fora de controle.

Não só o meu humor se tornou instável como também minha personalidade. De repente eu não era mais só a Sabrina, eu era a Sabrina e o Monstro. Agora, contando isso para vocês, eu sou o Monstro, não sou a Sabrina. E tinha também a dor insuportável no peito, a angustia, intercalada com a perda de sensibilidade, quando eu perdia a capacidade de sentir qualquer coisa e acreditava estar morta. De um jeito ou de outro eu fui piorando e piorando. Me tornei agressiva. Machucar as pessoas a minha volta se tornou um vício. Eu tenho um medo irracional de ser abandonada, então, quando alguém diz ser meu amigo, eu preciso de provas, preciso testá-los ao máximo para ver até onde aguentam ficar ao meu lado. Só assim eu me sinto bem ao lado de alguém, em um relação altamente destrutiva. Há muitas formas de machucar alguém que gosta de você, uma delas é se destruindo. A automutilação é extremamente útil para uma pessoa como eu. Se a dor aqui dentro é insuportável, eu me corto para aliviá-la; se estou com raiva de mim mesma ou de qualquer outra pessoa, eu me corto para me acalmar; se eu quero me vingar de alguém, eu me corto e coloco a culpa naquela pessoa; se eu lembro do passado ou tenho pesadelos, eu me corto para esquecer; se minha personalidade se altera diante de meus olhos e a realidade me foge do controle, eu me corto para ter certeza de que continuo viva... É um vício, é uma droga. O ato de se cortar, se bater, se arranhar, libera uma substância anestesiadora no cérebro, essa substância vicia e, como qualquer outra droga, precisa usar dela cada vez mais, ao longo do tempo, para conseguir o mesmo efeito. Então você começa se arranhando, ou fazendo pequenos cortes que não deixam nem cicatrizes, quando você dá por si você já está no hospital precisando de pontos porque não conseguiu controlar sua mão. Mas é uma ótima droga, totalmente legalizada, barata e eficiente. Eu não me orgulho das minhas cicatrizes, eu odeio meu corpo e o que eu fiz com ele. Mas afinal eu sou um Monstro, não posso fazer muita coisa quanto a isso."

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