"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Sobre a internação.



Todo mundo quer me enfiar um maldito calmante goela abaixo. Estou assustada, vendo minha vida descontrolada sendo arrancada de minhas mãos. O que vai acontecer agora? O que vai acontecer agora? Sim... Estou me destruindo. Sim, isso precisa parar. Mas... Não há outra forma? Precisa ser assim? E minha vida? Como fica? E meus amigos? E minhas coisas, minhas obrigações, meus direitos? O que eu fiz de errado? Eu sei que não deveria ver isso como uma punição, deveria ver como uma oportunidade, mas é difícil. Eu não sei lidar com a solidão, com a separação, sinto que vou deixar de existir se as pessoas que eu mais amo não estiverem comigo. Estou com medo, estou com vontade de sair correndo para bem longe, de fugir para sempre, de desaparecer, de morrer. Não é essa a vida que eu quero para mim. Eu nunca concordei com nada disso. Posso voltar atrás? Posso nascer de novo? 

Eu só quero ser uma pessoa normal e poder ser impulsiva a vontade sem me auto-destruir. Mas meus freios se partiram, não se sabe exatamente quando, e desde então eu sou uma montanha russa descontrolada, algo entre a depressão e a euforia, a psicose e a neurose, um pouco de tudo, muito de nada. Muitas vezes sinto que não estou vivendo e outras, que estou vivendo de mais. Não conheço o equilíbrio. Eu só quero uma garrafa de vinho, cigarros e minhas giletes. Não! Não! Não posso, não posso. Isso é o oposto de ser uma pessoa normal. E mesmo assim meus pés me levam para o abismo, minha visão se torna turva, meu monstro assume o controle e eu sou capaz de fazer qualquer coisa. Meu peito dói. Não é uma dor normal, é dilacerante, é incontrolável. Até quando? Até quando?

Não é uma punição, eu sei, eu deveria saber. É uma oportunidade. Uma oportunidade para melhorar, para encontrar finalmente o equilíbrio. Mas eu tenho medo, quem pode me culpar? Não quero ficar dopada, não quero me perder mais ainda, não quero virar um fantoche dos remédios. Há um tempo atrás eu queria uma camisa de força, mas agora minha auto crítica se perdeu e eu não quero mais camisa de força nenhuma, quero correr livre para onde eu quiser, quero fazer minhas besteiras impulsivas, quero ser irresponsável, quero a morte lenta dia após dia. Quero viver, quero viver. Não é normal essa energia toda, esse nevosismo e inquietação, eles me dizem, você pode fazer alguma besteira. Não é normal, não é normal. Meus pensamentos confusos voam em minha mente a mil por hora. Por que não? Por que não? Entro em pânico sem motivo nenhum e por alguns instantes entendo o que eles querem dizer. Eu vou fazer alguma besteira, vou fazer alguma besteira. Tudo bem, está tudo bem.... Eu vou. Se tiver vaga, se eu passar na avaliação. Eu vou. Vou tentar ser forte, vou tentar controlar a dor. Já passou da hora de mudar, eu não aguento mais do jeito que está, ninguém mais aguenta. 

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Agitação, inquietação, impulsividade.



Coração palpitando, pernas inquietas, mãos nervosas, mente a mil por hora. Vontade de correr, de fazer algo errado, de se atirar na frente de um carro, de bater em alguém, de gritar. Pra que? Por quê? Tanto faz. Mais uma xícara de café, por que não? Qualquer coisa impulsiva ou destrutiva. Me sinto viva, me sinto viva. Tão viva que eu preciso matar algo para compensar. Energia de mais, energia de mais. Mundo em câmera lenta. O que? Não consigo prestar atenção. Já passou. Ainda não foi. Do que você está falando? Adoro café. Álcool também, cigarros. Qualquer coisa errada ou proibida. O sabor do errado se espalha pela minha mente, me seduz facilmente. Por que não? Por que não? A vida não é engraçada? Posso senti-la em minhas mãos quase como se fosse algo físico, tenho vontade de apertá-la, sufocá-la, matá-la. Ah... A destruição. A auto-destruição. Velha amiga, velho vício. Tudo cede um dia. Algo me diz remotamente para me lembrar de todo o passo a passo que tanto a terapia me ensinou para me controlar. Mas do que estávamos falando mesmo? Tanto faz, passou. Me olho no espelho e meus olhos parecem estranhos. Meus olhos? Meu corpo me incomoda, como se não tivesse feito sobre medida para que eu habite nele, ele é grande de mais para minha alma pequena, mesquinha e deplorável.

Bobagens. Me sinto gorda, me sinto feia, me sinto errada, me sinto suja. Todos estão olhando para mim, todos estão olhando para mim e me julgando. Todos me acham gorda, e feia, e nojenta, e errada. As vozes em minha mente me derrubam com seus gritos incansáveis. Gorda, feia, má. Tudo é um pouco errado de mais. Meus pesadelos me perseguem enquanto estou acordada, tem algo errado. Eles deveriam ser só sonhos, só sonhos ruins. Eles nunca são só sonhos. O que está acontecendo? O que está acontecendo? Alguém consegue me explicar? Alguém precisa segurar minha mente. Rápido de mais, rápido de mais. A vida não é engraçada? Tenho vontade de correr, de me atirar na frente de um caminhão, de destruir algo bonito, como no filme. As pessoas me falam coisas bonitas e eu tenho ficar feliz por isso, mas as vozes em minha cabeça não me deixam, elas me tornam incrédula. Eu falo obrigada, muito bem, obrigada. Vocês são todos gentis de mais. As vozes riem de mim e a pontam em minha direção. Dizem que esses elogios são mentiras que as pessoas me contam para eu não me matar. Como as coisas são estranhas! Não é engraçado?

Besteiras. Me sinto um pouco louca, um pouco fora de controle. Alguém soltou o gatilho, agora que Deus me segure porque eu não posso mais. A gente sempre coloca a culpa em Deus porque é mais fácil, pobre Deus, parado no céu sem fazer nada enquanto centenas de crianças morrem diariamente nas mãos de adultos maus. Mas não é culpa de ninguém, claro. Acontece. O mundo é assim. Se conforme, se conforme. Sempre me diziam. Eu falava baixinho, chorando, que era injusto e eles me respondiam: O mundo não é justo. O mundo não é justo. Mais um soco em meu ego despedaçado, em meu coração arrombado e em minha infância roubada. O mundo não é justo. Eu tenho que aprender, tenho que me conformar. O que eu fiz de errado Deus? O mundo é injusto. É verdade, me esqueci. Se é injusto então a culpa também não é minha, se não é minha, por que eu me sinto tão errada? Por que essas barreiras? Esse medo, essa vergonha constante, essa culpa dilacerante, como se eu já tivesse nascido errada. Sem jeito, sem solução, há muito tempo parte do que eu sou. Bobagens. Quem liga? Mais uma xícara de café por favor, qualquer coisa que me deixe pior.

domingo, 15 de julho de 2012

Através do espelho



Se estou bem, se estou mal, não sei dizer. Os dias seguem confusos, frenéticos e arrastados. Hoje está tudo bem, amanhã minha vida acabou, daqui a uma hora estarei rindo, daqui duas, chorando, daqui três, sangrando, tranquila, nervosa, em pânico, feliz, depressiva, feliz. Não sei quem sou, não é mais o mundo que parece se desfazer aos meus olhos, sou eu mesma me desfazendo agora. Volátil de mais, instável de mais. Quem sou mesmo? Me esqueci, me perdi, não sei quem é essa pessoa que me olha no espelho. Tem algo errado, tem algo estranho. Tem sempre algo estranho. Como se eu fosse um quebra-cabeça e as peças estivessem colocadas no lugar errado, forçadas a se encaixar onde não deveriam, resultando em uma imagem confusa e sem sentido. Eu gosto de quebra-cabeças, gostaria de conseguir montar o que eu sou de forma correta, mas as peças já estão estragadas, muitas cortadas no meio, amassadas e sujas. Elas estão todas ali, é verdade, eu tenho tudo o que sou e porque sou em mãos, mas não consigo decifrar, não consigo consertar. Tento constantemente me entender e por mais que, em tese, eu tenha as justificativas em mãos, ainda não faz sentido, ainda falta algo, ainda não entendo.

Me sinto triste pela minha incapacidade de avançar nesse sentido. Nem mesmo a terapia e os remédios conseguem me manter na linha por muito tempo por causa desse algo que me falta, há sempre um momento em que meu avanço estaciona e retrocede. E então fica um pouco difícil de mais controlar minhas mãos, minha mente, o jeito como eu encaro a vida. Me sinto muito sozinha quando estou passando por esses momentos e me coloco em uma situação de solidão também. Paro de falar com meus amigos, de sair, de me divertir. Tudo perde o sentido, toda a minha lista de alternativas para me distrair da minha vontade constante de me cortar perde a graça e sua principal função, nada mais parece ser capaz de me manter calma e em paz (tirando uma ou outra pessoa especial, como minha namorada). Viver se torna muito mais difícil, quase impossível. A vida se transforma em uma batalha frenética contra sua vontade de acabar com tudo e sua voz interior fraquinha que implora por mais uma chance, pela milésima vez.

E eu não sei dizer como estou realmente. Creio que um pouco melhor, mas ainda assim algo vai mal. Tenho essas sensações que não entendo, que não sei como me livrar. A verdade é que minha mente é totalmente tomada de pensamentos ruins o tempo todo, talvez dai venha as sensações ruins e maus pressentimentos, as crises de choro constantes e momentos de desespero cego. Quero continuar avançando para sempre, quero conseguir entender meu quebra-cabeça, colocar as peças em seus devidos lugares. Mas não sei como, não entendo, não entendo. Não conheço a pessoa que me olha no espelho, tenho medo dela, do que ela faz comigo, do que pensa, do que pode fazer.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Mundo à parte



Eu meio que vivo em um mundo à parte. As pessoas percebem, as mais observadoras, que eu não estou lá. Fisicamente estou, mas minha mente está quase sempre longe. Não que mundo não seja interessante o bastante, ou as pessoas não sejam interessantes, não é isso. É só que eu sou acostumada a fugir, da realidade, das situações, dos problemas, das pessoas, de tudo. Fugir se tornou algo inerente a mim, faço sem perceber, sem esforço, no piloto automático. Eu não estou lá. Eu tenho meu próprio mundo secreto e é nele que eu vivo a maior parte do tempo. Aqui ninguém entra, por mais que eu me esforce para abrir as portas desse mundo e deixar as pessoas que eu mais confio entrarem, ninguém entra. Eu não tenho a chave desse portão, creio que joguei fora em um dia de raiva talvez, talvez ela nunca tenha existido, não me lembro. Mas ninguém entra. Tem gente que diz que eu criei essa barreira para me proteger. Talvez. Mas eu não me sinto segura aqui dentro também. Há um monstro que me espreita aqui dentro, algo que ao mesmo tempo faz e não faz parte de mim. Se um dia eu construí isso para me proteger, eu esqueci de colocar para fora meu pior inimigo. Eu mesma.

Mas às vezes é confortável, ou não... Na verdade eu não tenho com o que comparar para saber se é ou não confortável viver aqui dentro. É algo meio sem escolha. Eu simplesmente existo dessa forma, não sei viver sem ser dentro de meu mundinho. Peço perdão para aqueles que alguma vez já tentaram entrar aqui e se frustraram, como já disse, não sei quebrar essas paredes ou abrir esse portão. É difícil para mim prestar muita atenção para as coisas a minha volta, meu universo me distrai o tempo todo, há sempre um turbilhão de sentimentos e sensações que eu não sei expressar. Elas vem e vão ao sabor do vento e eu permaneço olhando para o infinito enquanto tento entendê-las. É uma perda de tempo tentar entendê-las, eu sou muito confusa, mas não consigo evitar de me distrair. Quem conseguiria? Ser tão distraída vive me gerando problemas, desde ter dificuldade para me concentrar nas aulas e atravessar uma rua sem quase morrer atropelada até dificuldade em relacionamentos (afinal é uma falta de educação da minha parte não conseguir me concentrar o tempo inteiro no que as pessoas falam a minha volta). É frustrante. Tento me agarrar a algo, quando sinto minha mente se perdendo, mas quase nunca dá muito certo. Lá se vai ela, indiferente ao que se exige de mim do lado de fora.

Não que eu me sinta diferente ou esquisita por ter meu próprio mundo, todo mundo tem seu próprio mundo. O problema é que o meu é blindado a titânio e eu sou de mais acostumada a permanecer aqui dentro. Eu preciso sair, já que não consigo deixar ninguém entrar. Mas é um pouco assustador. Muito assustador. Deixar meu universo a parte. Quase sempre quando consigo prestar atenção de mais no mundo real eu acabo ficando paranóica e assustada. É extremamente assustador perceber que você não tem controle nenhum sobre o que acontece a sua volta, ao contrário do que acontece dentro da sua cabeça, que você tem os script às mãos (em tese). Sim, muito assustador. Você nunca sabe o que as pessoas podem fazer, você nunca sabe o que vai acontecer no próximo segundo, minuto, hora, que seja. Você não sabe de nada. E não pode fazer nada a respeito. Eu decididamente sou muito mal acostumada.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Porque todos nós temos dias ruins



De repente sou invadida por uma vontade incontrolável de chorar. Assim, meio sem motivo, sem aviso, sem solução. O que posso fazer? Me esforçar, me esforçar, de novo e de novo. Não consigo controlar minhas emoções, é uma guerra perdida lutar contra o monstro que eu tenho aqui dentro. Não vale a pena. Resta a aceitação ou a desistência, são diferentes mas poderiam muito bem significar a mesma coisa. O que posso fazer? Meu peito dói, minha alma grita, meus olhos se perdem no espaço e eu simplesmente preciso de algo que me mantenha viva. Desconfio que meu estabilizador de humor não anda funcionando como deveria, mas minha psicóloga não concorda. Se não são os remédios, então o que há de errado comigo? Por que eu não paro de piorar? Por que a vida anda tão insuportável? Por que dói tanto? As coisas não deveriam ser assim, deveriam? Eu simplesmente não consigo parar de chorar. Eu estou vivendo uma tortura e não consigo fazer com que ninguém me entenda. De novo, não consigo. Acho que não sou clara o bastante, acho que nunca soube pedir ajuda. Ou então as pessoas não conseguem acreditar em mim, nunca sentiram nada parecido para me entender. Não sei. Me esforçar... Não consigo entender como me esforçar vai fazer a tristeza e a dor irem embora. Eu me corto porque todo meu ser dói, me corto para aliviar essa dor, parar de me cortar não vai fazer essa dor ir embora, só vai deixar um vazio que eu vou querer preencher com outros vícios.

Não, não entendo essa lógica. Entendo que não posso me cortar, que isso é errado e que não posso continuar fazendo isso, mas não entendo como parar de fazer isso pode me ajudar, falando em minha condição geral. Eu quero que a dor pare, quando a dor parar, eu não terei mais motivos para me cortar. Será que não podemos simplesmente arranjar um jeito desse sofrimento acabar? Deve ter um jeito, deve ter... Não é possível. Eu preciso tanto de ajuda agora. Acho que nunca foi tão difícil ficar longe de uma lâmina. Estou tentando! Estou tentando! Me desculpe. É só que as vezes dói tanto que eu mal consigo respirar. É enlouquecedor, sinto como que um buraco tivesse se aberto sobre meus pés e eu fosse me perder para sempre, sinto o peso do mundo inteiro em minhas costas e todos esperam que eu suporte e continue suportando como se não fosse nada. Não consigo, não consigo. Estou tão perto do meu limite.

E quando as lágrimas finalmente parecem ter acabado, sinto meu peito tão vazio que desconfio estar morta. Eu vou perder a cabeça se as coisas continuarem assim. Eu não aguento mais, eu não aguento mais. Estou tão cansada e já disse isso tantas vezes que se tornou irritantemente repetitivo. Mas mesmo assim nada muda. Preciso de ajuda, e nada muda. Eu sei, eu sei... Eu preciso começar ajudando a mim mesma. Estou tentando. É só um pouco difícil para mim mesma ter um pouco de amor próprio, um pouco de consideração e empatia.

domingo, 8 de julho de 2012

Uma história de violência



Você nasce, não escolhe onde, quando ou em qual família. Durante os primeiros anos da sua vida você não escolhe nada, você não pode fazer nada a respeito de coisa alguma. Um ano, dois anos, três anos. A vida é pequena e simples, você sorri para todo mundo, imita tudo o que vê e faz tudo em busca de amor e carinho, seja ele como for. Você vai crescendo e o mundo a sua volta se amplia. Você vê seus coleguinhas na escola e sente um certo estranhamento, por algum motivo, que você não sabe explicar ainda, você se acha diferente deles, você não se encaixa, você não consegue ser como eles, não consegue se enturmar devidamente. Todos eles falam de mais, brincam entre si com uma naturalidade que você não consegue entender, fazem amizade fácil, aprendem como devem aprender, alguns mais rápido outros um pouco mais devagar, mas aprendem, se interessam por tudo, enfim, são crianças. Você não. Você é quieta, tem dificuldade para falar, para fazer amizade, para entender o mundo a sua volta, e sente algo terrivelmente errado dentro de você. Você é fechada por natureza, não se sente confortável em lugar algum, é quieta e tímida e quanto mais cresce e mais percebe que não consegue se encaixar, mais se isola.

As pessoas passam a implicar com você. Por que você é tão estranha? Por que é tão feia? Por que é tão gorda? Por que seu cabelo é assim? Por que você não fala? Por que está chorando? Hein? Hein? Hein? Eles te cercam e riem de você, apontam em sua direção, te empurram, puxam seu cabelo, te perseguem. E você não consegue entender porquê. O sentimento de estranhamento dentro de você cresce cada vez mais. Você olha distante para as outras pessoas e se imagina vivendo outra vida, cria fantasias em sua mente, mentiras, sonhos, se esconde atrás de livros e histórias fantasiosas de mundos onde os desencaixados viram heróis e finais felizes existem. Mentiras, mentiras e mais mentiras. A perseguição se torna pior, atinge outro nível. Violência. Violência onde quer que você vá. Em casa, no prédio, na escola, não importa. Você está sendo assassinada a cada dia e ninguém parece perceber ou se importar. Você corre e corre, de tudo e de todos, você se assusta com o mínimo movimento, com o mais inocente toque, com a palavra mais macia. Dói. É difícil para você perceber onde e porquê, mas dói. Você não entende. Tem algo de errado com você, é a única certeza que cresce a cada dia. Tem algo de errado.

Você é quase uma adolescente agora. Se olha no espelho. Sente repulsa por si mesma, se sente suja. Tem algo errado. Não tem? Passa a mão pelo corpo, desconfortável. De repente é tomada por uma raiva enorme de si mesma, as lágrimas escorrem como nunca. Tem algo errado, tem algo errado, tem algo errado. Soca a própria cabeça sem saber porquê, atira tudo ao seu alcance no chão, chuta os móveis do seu quarto e chora. Chora como nunca, sentindo um buraco enorme se abrindo em seu peito. Apaga a luz e se encolhe em um canto. Por favor me deixem em paz, por favor me deixem em paz, por favor me deixem em paz, por favor, por favor, por favor. Você não entende. Vive se escondendo, atrás de sorrisos falsos, mentiras e máscaras e nem sabe direito porquê. Mas isso é necessário, é necessário para se suportar a vida. Ninguém pode saber, ninguém pode saber, nem mesmo você mesma. Você se torna quase uma sombra do que um dia poderia ter sido. É passiva, tímida, fechada, antissocial, indefesa, autodestrutiva, facilmente influenciável. Um desastre. Um desastre ambulante.

Você é uma adulta agora. As lembranças de uma infância e adolescência que você não quer admitir te atormentam diariamente. Por que eu nunca pedi ajuda? Tantos anos de silêncio e sofrimento. Tantos anos perdidos em um inferno constante. Aquele dia, em que eu caí na varanda do meu apartamento e encostei minha cabeça em minhas mãos, derrotada, chorando como um bebê. Quantos anos eu tinha? 11? 10? Exausta, física e psicologicamente. Minha mãe me perguntou porque eu chorava. Não conseguia me explicar. Como poderia? Ela me falou sobre Deus, que ele me ajudaria. E eu fui deixada ali no chão, exatamente do mesmo jeito que estava antes. Deus... Deus? Deus fica no céu, não no inferno. Eu vivo no inferno, é claro que ele nunca vai descer até aqui para me buscar, não sei porque eu esperei tanto. Ninguém me ajudou, nem mesmo eu mesma. Eu não escolhi onde nasci, nem quando nem em qual família. Mas creio que em algum momento tenha escolhido o silêncio, pensando que não existisse a possibilidade de se falar. Não, não. Não escolhi nada. Eu só me observei de bem longe, sem me mexer, sem reação nenhuma, enquanto o mundo destruía tudo o que eu poderia ser e das cinzas nascia algo irreconhecível. O que eu sou agora.

Perigo: Não se aproxime.



Me desculpe, me desculpe. Me desculpe por pedir desculpa. Eu não sei o que fazer. Tudo o que eu faço é sempre errado de mais, como posso não me julgar? Tropeço o tempo inteiro, não aprendo nunca. Essa fragilidade irritante, essa bomba de sentimentos pronta para explodir a qualquer instante em resposta ao mínimo movimento. Eu faço tudo errado. É tudo culpa minha. Eu nunca sou boa o bastante, nunca. Não sou eu, é só minha cabeça, meu monstrinho. Não consigo. Não consigo não pensar nessas coisas, não consigo não ser "egocêntrica", como você me acusou, como todo mundo me acusa. Me desculpe, me desculpe. É tão difícil. Eu preciso parar de reclamar, sei disso. Está todo mundo cansado de me ver mal, de perder as contas de quantas vezes eu já voltei a me cortar, de não conseguir nunca me ajudar do jeito que querem. De novo sinto ser um caso perdido, um desperdício ambulante de tempo e espaço. Até quando isso? Por que tudo é tão difícil? Por que eu não posso simplesmente sorrir e esquecer de tudo o que faz minha alma sangrar diariamente? Eu quero a leveza do vento, a pureza da água. Mas carrego o peso de uma montanha, a sujeira de uma vala imunda.

Me sinto muito sozinha às vezes. Não consigo conversar muito bem pessoalmente com quase pessoa alguma. Ninguém gosta de ouvir o que sai de minha boca. Não é agradável, não é reconfortante, não é algo que alguém gostaria de ouvir ou se sentiria confortável para tal. Me sinto mal falando, não quero causar dor a ninguém, não quero ser um problema maior do que já sou. Também não quero esses olhares de pena, de misericórdia, de sei lá o que. Quero só ser uma pessoa normal, com uma vida normal, nada de mais. Quero poder sair de casa e sorrir sem motivo, só por estar viva ou por qualquer outra besteira. Não quero mais pessoas me olhando na rua, me julgando, se assustando com as marcas incontáveis em meus braços. Não quero mais ser eu. Quero nascer de novo, quero dois braços novos em folha, quero um cérebro sem defeitos dessa vez, quero um caminhar mais firme e a força para levantar os olhos do chão. Nada de vícios, nada de dor, nada de masoquismo cego, tropeços incertos, defeitos aos montes. Estou cansada de ser eu, muito cansada.

Ah! Os otimistas, os otimistas. Diriam que tudo poderia ser pior, que eu deveria agradecer pelo que tenho, pela sorte que tenho. Tudo é sorte para eles, até o ar que respiram é uma sorte. Meu deus, como são irritantes. Sinto vontade de me atirar de um prédio sempre que me encontro com uma pessoa positiva de mais. Não adianta, eles não entendem. Tudo o que para eles é sorte, meu cérebro transforma em azar. É uma capacidade incrível que eu tenho de pintar o mundo todo de cinza, de sugar a energia positiva de tudo a minha volta e transformar tudo em um inferno. Tristeza é algo contagiante, eles dizem que não, mas é. Eu mesma alias já disse, que transtornos mentais ou problemas psicológicos não eram contagiantes e por isso não se devia abandonar essas pessoas por medo. Tudo mentira, inocência minha. Tudo se pega. Os covardes são os mais espertos, devo admitir, os que fogem de tudo isso logo na primeira oportunidade. As pessoas tem a mania de gostarem de mim, não sei direito porque, é um grande mistério para mim, por pena talvez, que seja. De qualquer jeito sempre tenho vontade de avisá-las para não se aproximar, é perigoso de mais, eu machuco tudo a minha volta. É algo tão inevitável para mim quanto respirar. Um dia ou outro eu vou te machucar, pode contar com isso. Me desculpe por isso.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Por mais uma chance.



De novo. Tenho medo. Eu não posso simplesmente ficar curada? Um tratamento milagroso, algo assim, faço qualquer coisa. Pedi por ajuda, finalmente pedi por ajuda, mas agora tenho medo do que essa ajuda vai me custar. Eu temo pela minha liberdade, temo pela minha autonomia incerta, pelo meu direito de fazer besteiras atrás de besteiras. Eu sei, eu sei. Eu preciso de ajuda. Eu não aguento mais. Não posso viver assim, é impossível viver assim. Eu quero uma mão que me segure quando eu não tiver mais chão, quero uma camisa de força, quero algo que me prenda a realidade quando nada mais for certo. Mas o que isso vai me custar? Me pergunto agora se eu realmente deveria ter pedido ajuda. É um pouco perigoso me deixar solta por aí, é verdade. Tenho a terrível mania de cortejar a morte, ser autodestrutiva e impulsiva. Tudo para mim é o fim do mundo, tudo é complicado demais, sofrido demais. Dói respirar, dói estar viva, dói qualquer mínimo movimento.

É... Eu preciso de ajuda. Há muito tempo está claro que não consigo sozinha. Vivo mal, arrastando tudo com a barriga, tropeçando e caindo o tempo todo. Penso em me cortar, penso em morrer, penso, enfim, em desistir. Mas vou levando, vou levando. Há dias bons de vez em quando, dias em que acredito que há uma solução, que no fim não estou tão mal assim, que tudo vai ficar bem e eu vou conseguir melhorar. Mas então os dias maus voltam e toda a esperança desaparece, todos meus sonhos são arrancados de mim e não sobra nada a não ser uma criaturinha encolhida, deplorável, chorando compulsivamente. A morte, a morte. Imploro por ela, ao mesmo tempo que rezo para alguém me impedir de chegar a esse ponto. Por favor, me deixem morrer, por favor, me salvem. Eu preciso de ajuda, eu preciso de ajuda. Ajuda? Não, não, não... Por favor, não me internem. Eu sei que sou um perigo para mim mesma, sei disso, mas vocês não podem simplesmente interromperem minha vida quando bem entenderem. Eu tenho vida, não importa o quão deplorável ela seja, não importa o fato de eu chorar quase todo o santo dia e permanecer sangrando não importa o que aconteça. É a MINHA vida. Não quero que ninguém a tire de mim, se eu não melhorar, se eu não posso melhorar, eu mesma quero por fim nela.

Talvez eu não devesse ter pedido ajuda. Talvez eu devesse ter ficado quieta, continuado a mentir. Está tudo indo muito bem, obrigada. Não... Não posso mentir. Há algo em mim gritando por mais uma chance, uma única chance. Sim, eu preciso de ajuda. Preciso desesperadamente de ajuda. Por favor, não desistam de mim. Por favor, me deem alternativas, horizontes, esperanças. Eu faço o que for preciso para melhorar. Qualquer coisa. Não me deixem aqui morrendo dia após dia. Isso não está certo, ninguém pode viver assim. Por favor, me ajudem.